terça-feira, 26 de novembro de 2013

A APROVAÇÃO DO QUEIJO SUÍÇO

Impregnado de 3,9 mil milhões de euros de nova austeridade, o Orçamento do Estado de 2014 será alvo de votação final na próxima terça-feira

O resultado assemelha-se desde já à pescada: PSD e CDS, suportes da coligação governamental, viabilizarão o documento perante o clamor exasperado de toda a Oposição.

Cumprir-se-á apenas um formalismo - e esse é o ponto.

O país já não se lembra de dispor de uma projeção orçamental minimamente credível. Sob as mais variadas formulações, a mais vulgar das quais a do Retificativo, os orçamentos têm-se assemelhado a queijos suíços. 

Umas vezes, o argumentário fundamenta-se na imprevisibilidade da conjuntura internacional; outras vezes, os falhanços devem-se ao plasmar de números pela via demagógica, a do combate político. Discutem-se e aprovam-se, enfim, documentos condenados ao erro.

O Orçamento do Estado de 2014 é paradigmático - e não se trata só de não haver uma única alma, incluindo as dos parceiros internacionais, convicta do cumprimento da projeção de 4% de défice nele inscrito.

Uma singularidade marca nos últimos tempos os riscos de falhanço orçamental - ou de necessidade de reorientação de rubricas: a violação de princípios constitucionais. E alguns desses riscos seriam dispensáveis pela simples troca de afrontas ideológicas - pelo menos aparentes - por inquestionável fundamentação jurídica.

O Orçamento do Estado a aprovar terça-feira tem todos os ingredientes para não ser levado a sério, dentro de 25 dias ou nos próximos meses.

Antes ainda do falhanço no crivo da conjuntura internacional, os números inscritos no Orçamento do Estado dependem dos juízes do Tribunal Constitucional. Seja pelo pedido de fiscalização sucessiva de várias normas - cortes de salários na função pública e outros...-, seja porque, antes ainda dessa saga de turbulência político-constitucional, o Palácio Ratton já recebeu a solicitação do presidente da República para se pronunciar sobre a decisão de se fazer (com retroatividade) convergir as pensões da CGA com as da Segurança Social, violando, entre outros conceitos, o inalienável princípio da confiança.

São muitas as potenciais infrações constitucionais e representam centenas de milhões de euros....

Alvos de intoleráveis pressões, pró e contra a declaração de constitucionalidade de certas normas, acentue-se, os juízes do Tribunal Constitucional dificilmente deixarão de chumbar alguns dos propósitos consagrados no Orçamento do Estado de 2014. E se assim for, estarão a cumprir, tão-só, a função de velar pelo cumprimento da Lei Fundamental de um Estado de direito.

Há na possibilidade forte de falhanço dos números inscritos no Orçamento do Estado de 2014 algo de incompreensível, a não ser à luz de uma matriz ideológica: a mania do Governo de apresentar propostas como sendo as únicas possíveis. Um argumento tolo, sobretudo quando não respeita a contratualização e a confiança entre Estado e cidadãos, mas é incapaz de ousar pôr em xeque uma só alínea de um só contrato ruinoso das PPP.

Retirada daqui