sábado, 5 de outubro de 2013

INDEPENDENTES OU NÃO...

O desafio dos novos presidentes de Câmara recém-eleitos é enorme. Claro que iniciar funções com o élan de ser uma projeção da sociedade civil e não dos vilipendiados partidos políticos juntando a esta condição a força de ter sido conseguido pela primeira vez, ajuda

O estado virginal dos eleitos e a expectativa dos eleitores são variáveis positivas importantes que podem ser decisivas numa nova forma, que se impõe, de compreender e atuar sobre os territórios.

O desafio é muito complexo e exige muita reflexão. Na verdade, reflexão que deveria ter sido feita e participada por todos nós antes do escrutínio eleitoral. Mas não aconteceu. Os programas eleitorais foram tardios, sintéticos e quase iguais (por família política).

No único debate a que assisti relativo ao ato eleitoral do Porto, nenhum dos candidatos saiu do figurino tradicional ditado pelas competências formais de um presidente de Câmara a ponto de parecer que o principal desafio da segunda cidade política do país era sobretudo a omnipresente "regeneração urbana".

E no entanto daqui para a frente, e em especial numa cidade como o Porto, a governação do presidente de Câmara terá de ser feita a partir de um novo ponto focal que, sem deixar de prover as competências básicas consignadas na lei, tem sobretudo de saber ser o nexo vital tantas vezes em falta nas cadeias que geram valor, no território ou que sobre este atuam.

Ou seja, temos de continuar a fazer funcionar o urbanismo, o licenciamento económico, a educação, o trânsito, o tapar os buracos da rua ou os teatros municipais. De preferência, melhor e mais depressa.

Mas, na verdade, o que realmente interessa é compreender e fazer apreender a vocação de um território, procurar ser o parceiro que falta para que a ligação entre as universidades e as empresas se faça melhor, antecipar e lutar pela resolução dos nós que estrangulam a vida económica ou o emprego, procurar ideias novas ou já testadas para que possamos ser mais e mais novos, conhecer e chamar pelo nome todos os jovens criadores ou empreendedores, acreditar que a verdadeira luta pela dignidade humana não se faz pela recuperação mais ou menos vistosa de bairros sociais, mas sim pela mobilização incessante de uma prática de cidadania que nos englobe a todos....

No plano simbólico, por exemplo, a Câmara do Porto não pode assumir e não deve projetar a cidade como um bastião de boas contas, granítico e cinzento. Sem deixar de cumprir, tem sobretudo de se assumir como um farol que, aceso pela energia de cada ligação que consegue fazer acontecer, mobiliza e estimula a vitalidade das pessoas que aqui vivem, trabalham ou a visitam.

Trata-se de ajudar a criar e a manter uma rede e não de ser o topo de uma pirâmide com privilégios qualitativos de organização e procura de resultados.

E no Porto os dados difíceis estão lá, a desafiarem uma compreensão evoluída e partilhada. Perdemos 9,7 da população nos últimos 10 anos, temos um índice de envelhecimento de 189,9 face à Região, 23,4 % dos alunos saem precocemente da escola (não acabam o Ensino Secundário), exportamos apenas 1000 milhões dos 16 mil milhões que exporta a Região e somos muito, muito mais comerciais (serviços) do que industriais, sem que tal se reflita no planeamento da cidade.

Não tenho a menor dúvida de que os ingredientes para a solução destes problemas estão debaixo dos nossos olhos. Mas cada um só vê um pedacinho do puzzle. A Câmara não pode e não deve querer montá-lo. Mas pode e deve estimular incessantemente a procura do ângulo a partir do qual a imagem passa a fazer sentido. Em especial uma Câmara como a do Porto.

De uma certa forma, a tarefa ainda vai a tempo. Sem carteira de investimentos tradicionais por perto, é possível e quase obrigatório o desafio da superação. E, desse ponto de vista, talvez a qualidade dos 120 anos recém-cumpridos do Futebol Clube do Porto possam ajudar!

Retirada daqui