Gosto de livros assim, que «arrancam» logo no início. Pedro Garcia Rosado tem esse hábito nos seus policiais e faz muito bem. Morte na Arena, uma edição Topseller (o livro sai a 29 de agosto), é mais um bom exemplo disso.
E tem outro hábito, o autor: não se atrapalha em fazer jorrar sangue e criar cenários horríveis e macabros. E nem sequer gosta de deixar as coisas apenas subentendidas. É tudo muito claro. Vai direto ao assunto e com isso ganha o leitor, que assim tem nas mãos um livro vivo, trepidante e, em consequência, envolvente e irresistível.
Neste Morte na Arena não há tempo para o leitor pensar em coisas tipo: “E se avançasse umas tantas páginas, será que perderia o fio à meada?” É que por vezes deparamo-nos com livros tão grandes e rebuscados que a sensação que persiste é que há ali páginas desnecessárias. Servem, essas páginas excedentes, aparentemente, apenas um propósito, convencer quem as escreve que se trata de um autor credível, pois persiste entre muitos a ideia de que livro com poucas páginas é livro pouco profundo.
Mas com Pedro Garcia Rosado não será a poupança de palavras a impedir-nos de refletir, pois Morte na Arena deixa muito em que pensar, nomeadamente em relação à sociedade portuguesa e aos respetivos podres, principalmente ao nível das forças policiais e da Justiça, e até do poder político.
Para este romance/thriller Pedro Garcia Rosado recorre aos seus habituais «convidados»: Gabriel Ponte, o ex-PJ, a sua ex-mulher Patrícia, inspetora coordenadora da PJ, e a ex-amante de Gabriel, Filomena, a jornalista.
É com bastante interesse que se acompanha as investigações, tanto a oficial como a de Gabriel, que se completam mutuamente, relativas ao aparecimento em Lisboa de partes do corpo de uma rapariga (filha de um líder partidário) desaparecida uns meses antes e dos corpos de quatro agentes da polícia, que foram encontrados em circunstâncias e locais suspeitos. Descemos, literalmente, ao submundo de Lisboa, um mundo de túneis e esconderijos debaixo de terra onde coabitam ratos e os rejeitados da sociedade, assim como uma nova classe, vinda do alto, que resolve divertir-se e fazer dinheiro às custas das vidas dos oprimidos e mais debilitados, com um total desprezo pelo valor de uma vida humana.
Gabriel Ponte e os seus «amores» baixam ao Inferno, onde se debatem com o próprio Diabo e outros semelhantes a este. É essa descida aos infernos que nos leva a um cenário hiperviolento, brutal, sangrento, chocante! Atadas todas as pontas, mergulham num poço de podridão e imundície, de onde, como é costume nas obras de Pedro Garcia Rosado, as elites não escapam imunes, prontas que estão, sempre, a aproveitar-se dos mais fracos, que desprezam e tratam como seres inferiores, ali presentes apenas para servir de objeto de entretenimento, de um meio para atingir um fim, enfim, meras marionetas, mas de usar e literalmente deitar fora.
O que Morte na Arena nos revela é um verdadeiro submundo no subsolo de Lisboa, os alicerces podres e corrompidos de uma cidade aparentemente luminosa e límpida. Leva-nos a pensar no que estará por debaixo das aparências, do que se vê.
Este policial, tal como os anteriores do autor, é, ao fim e ao cabo, uma obra de denúncia onde não é poupada a nossa sociedade. Um livro muito atual que se lê num ápice, como qualquer bom policial, e perante o qual se percebe que o autor sabe o que faz, não só por dominar sem mácula este género literário como por, a nível de enredo, dar a ideia de saber muito bem em que meios se movimenta, o que não deixa de ser assustador.
Se a nossa sociedade é mesmo assim…
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