terça-feira, 2 de julho de 2013

O TRIBUNAL CONSTITUCIONAL É INIMIGO DO GOVERNO?

Marques Mendes, na sua habitual intervenção na SIC, afirmou que só mesmo o Tribunal Constitucional pode levar o Governo ao tapete

O ponto de vista é válido, já que o histórico da intervenção dos juízes do Constitucional tem sido sempre no mesmo sentido: não levantar problemas no aumento de receitas e colocar todas as reticências na diminuição de despesas.


Ou seja, o TC age - se por dever da Lei Fundamental ou se por motivos menos nobres, não sei nem quero fazer juízos de intenção -, como se o Estado não pudesse cortar substancialmente qualquer benefício já existente. Percebe-se que há a ideia dos direitos adquiridos (concordando-se ou não com ela), mas na realidade, nenhum Governo em Portugal fará uma reforma do Estado sem cortar nesses direitos. Haverá quem pense que ainda bem! -, mas eu penso o contrário. 

O Estado, tal como as famílias, as empresas e, de um modo geral tudo o que existe tem de estar preparado para bons tempos e para maus tempos. Para fases em que pode ser mais e menos generoso, mais e menos abrangente.

E isto levanta um problema político sério porque, como já foi várias vezes afirmado, no pós-troika, o essencial da austeridade continuará. E, ainda que houvesse um default ou um perdão da dívida, o facto de não podermos continuar com défices do Estado como até aqui imporia essa austeridade, senão muito maior como no caso de uma reestruturação não negociada ou de uma saída do Euro.

Mas um país não pode viver com um Tribunal que, para cumprir a lei (ou a sua interpretação da lei), impede qualquer reforma necessária. Mas também não pode viver com um Governo que sistematicamente apresenta leis que não são (na perspetiva do Tribunal) conformes à sua Constituição. Reparem que não me refiro a este Governo em particular. Eu acredito que outro Governo terá o mesmo problema - a menos que os juízes tenham apenas Passos Coelho em mira, o que não me pareceria próprio de um TC.  

Assim sendo, o desenlace só pode ser por uma rotura constitucional. Eu penso que já todos os perceberam, mas ninguém quer falar dela por falta de coragem política. Acontece, que o adiar dos problemas, como nos ensina a vida, torna-os mais graves. E antes que essa rotura seja, ela própria, inconstitucional e feita de modo a não garantir quaisquer direitos, seria absolutamente necessário que houvesse no Parlamento um entendimento sobre o que é possível alterar, de modo a que não existam sucessivas inconstitucionalidades nas leis que visam diminuir a despesa do Estado.

Se isso não for possível, como aliás temo, resta-nos continuar a caminhar para um abismo insondável. Porque não é substituindo Passos Coelho por Seguro que faz a crise terminar (embora possa baixar o nível de irritação política, o que aliás é o mesmo que escrevi sobre a substituição de Sócrates por Passos, quando defendi que o PEC IV não devia ter sido chumbado); também não é rompendo com a troika que faz aparecer dinheiro. 

E mesmo que a Europa mude de política e nos ajude substancialmente, é óbvio para quem ler a evolução económica do país nos últimos 20 anos, que o Estado tem de gastar menos.

E substancialmente menos.

Retirada daqui