Vivemos com a propensão para pedir o que não queremos.
A nossa memória é
demasiado selectiva e leva-nos com muita facilidade a cometer os mesmos erros
num curto espaço de tempo. O desejo de viver nos melhores dos mundos faz-nos
acreditar que basta ter vontade para que as coisas aconteçam.
A partir dessa cura, as coisas aqueceram de tal modo que, quando a
generalidade dos génios políticos e económicos se lembraram dos efeitos
secundários, já a crise das dívidas soberanas se tinha instalado como lapa
agarrada às rochas. Mas também aí os doutores da globalização encontraram uma
solução milagrosa que começou pouco depois a revelar efeitos secundários graves.
Já devem andar à procura de cura para a nova crise global, que é claramente a
crise do emprego, ou melhor, a crise do desemprego, embora não se saiba muito
sobre a matéria porque andam todos com medo de tomar decisões.
A memória a que apelo é a que nos dá conta de que todas as curas que nos
apresentaram desde a primeira crise em 2008 têm tido efeitos secundários
gravíssimos. Seria bom pensar muito bem antes de decidirmos o que é que queremos
pedir aos nossos dirigentes, nacionais e europeus. Entrar pelo caminho fácil de
pedir um novo despejo de dinheiro na economia para criar emprego pode ser
começar tudo outra vez. Regressar ao fim da primeira década deste século como se
nada de grave aí tivesse acontecido é ter a memória demasiado curta.
A memória exercitada, para que não se perca nada de essencial do que se
passou no passado recente, permite-nos olhar para o presente e ver com clareza
que as coisas também não estão bem. Nada bem. A crise económica que virou crise
financeira e que voltou a ser económica trouxe de arrasto uma grave crise
social. Aqui e em muitos outros países da Europa.
O que a memória também nos ajuda a perceber é que a pior das soluções é a que
prometer a cura mais rápida. Pode custar muito a admitir, mas serão precisos
vários anos para criar um crescimento sustentável.
Aqui e em muitos países da
Europa.
Por cá devemos insistir com o Governo para ter bom senso. Ouvindo a rua, a
oposição, o Presidente, os parceiros sociais e alguns dos seus próprios
militantes, não pode ser assim tão difícil perceber que o rigor orçamental tem
de ser acompanhado de políticas mais amigáveis do investimento. Não estaremos a
pedir nada que a memória nos diga que vai resultar num desastre.
Paulo Baldaia, aqui