O bloco político e social que apoia a governação do País faz da afirmação de
dogmas a sua forma de disputa da hegemonia no terreno das ideias e das
políticas.
A negação de que haja alternativas "sérias", "realistas" e
"credíveis" fora do espaço da rendição à austeridade e ao empobrecimento é a
ferramenta tática por excelência de que esse bloco faz uso para a dogmatização
do debate.
Por isso, é na amplitude e radicalidade da disputa e na consistência política
das escolhas que se joga a capacidade de ser oposição.
A qualificação da rábula da suposta demarcação de Paulo Portas face à política de austeridade do Governo como expressão de uma estratégia eficaz e inteligente de oposição é uma rendição à estratégia de quem manda.
A qualificação da rábula da suposta demarcação de Paulo Portas face à política de austeridade do Governo como expressão de uma estratégia eficaz e inteligente de oposição é uma rendição à estratégia de quem manda.
Os comentadores-dirigentes-do-PSD e os comentadores-dirigentes-do-PS
irmanaram-se no sublinhado da importância da suposta oposição à la Paulo Portas:
estar por dentro, apoiar o mais possível tudo e mais alguma coisa, mostrar
"realismo" e dar ares de "homem de Estado", voltar a apoiar tudo e mais alguma
coisa e fazer uma grande farronca sobre uma medida que já se sabe que não é para
levar a sério. Elevar esta rábula primária de Paulo Portas à categoria de
oposição é gozar com o povo.
Portas não conseguiu mudar nada - nem, de facto, alguma vez o quis - porque,
ao colocar-se convictamente dentro do espaço do "realismo" e da "seriedade" que
apoia a austeridade, ele apoia realmente tudo o que o seu Governo propõe. Ora,
Paulo Portas e o CDS não são consciência social desta maioria coisa nenhuma.
Porque pura e simplesmente ela não a tem e não a quer ter. São protagonistas e
não figurantes; são convictos e não resignados; querem a austeridade, a
diminuição das pensões e o esvaziamento das prestações sociais e não a sua
moderação sensata; são autores desta política e não seus intérpretes momentâneos
e críticos.
A velha tática da direita de ser simultaneamente poder e oposição para poder
ganhar nos dois tabuleiros é um embuste e uma desonestidade política sem limite.
Que outros se lhe rendam e ajudem a dar-lhe estatuto de coisa séria é algo
particularmente grave. No fundo, são oficiantes da mesma liturgia que sugere que
a oposição serve para conter os danos de uma política inevitável e que se o
conseguir merece hossanas.
A oposição ao governo da austeridade não é um truque nem um exercício de
simulação. É a afirmação clara de um contraste e a defesa lúcida e corajosa de
uma alternativa de conjunto ao modelo social que se está a implantar e às
políticas que lhe dão suporte. Por isso, um discurso de oposição séria começa
por não aceitar os pressupostos da governação. Aceitar disputar a hegemonia da
direita no campo definido pelos seus pressupostos ideológicos é jogar para
perder por poucos, não para derrotar o adversário. E quem assim joga arrisca-se
a levar uma abada monumental.
A oposição ao governo da austeridade não se limita a um conjunto de soluções
técnicas diferentes, com mais uma pitadinha de crescimento e uns gramazinhos de
"consciência social", "porque não dá para mais".
Afirmar sem hesitações que o
Estado Social é músculo e não gordura da democracia, defender em coerência que é
no reforço e não na fragilização do Estado Social que o País tem que apostar e
ter o discernimento de mostrar que essa escolha exige uma outra - uma
renegociação dos prazos, dos juros e dos montantes da dívida e o alinhamento
solidário com outros Estados triturados pela ditadura da dívida - isso sim é a
oposição exigida por uma democracia digna desse nome.
José Manuel Pureza, aqui