1-Desta vez, Medina Carreira não teve direito a primeira página por causa dum
dos seus famosos gráficos, nem por mais uma das suas previsões do fim do mundo,
nem mesmo por chamar vigarista ou ignorante a alguém.
Não, o jornal Sol relatava
uma busca a sua casa no âmbito da investigação ao caso "Monte Branco". Para
temperar a notícia não faltou a fotografia com o comentador a piscar o olho com
ar de tramóia.
Assim ficamos a saber que a
justiça praticamente não dorme, que é pela fresquinha que se apanham as
malandrices. Ou então a informação saiu para que pensássemos que a coisa era
mesmo urgente. Fôssemos inocentes e já não tivéssemos visto estes números vezes
suficientes e descartávamos logo a última hipótese. Infelizmente, temos boas
razões para não sermos.
Curiosa, porém, foi a reacção ao caso Medina Carreira e a forma como foi
tratado face aos variadíssimos episódios similares anteriores ou mesmo com o de
Teixeira dos Santos, dessa mesma semana. A Procuradoria resolveu levar a cabo
uma investigação sobre violações ao segredo de justiça (não vale rir) e figuras
destacadas da sociedade portuguesa mostraram a sua indignação face ao
sucedido.
E em que se distingue o caso Medina Carreira de todos os outros casos de
violação do segredo de justiça, nomeadamente do de Teixeira dos Santos? Em
rigorosamente nada. O comentador popular não foi, como muitos outros, protegido
por quem o deveria proteger: o sistema de justiça. Foi apenas mais um que viu o
seu nome escarrapachado num jornal na sequência de investigações que podem ou
não levar a uma acusação, e que na esmagadora maioria das vezes não levam.
As palavras para descrever o que ocasiona a combinação entre a violação do
segredo de justiça e a sua divulgação em órgãos de comunicação social estão
definitivamente gastas. Esta espécie de pacto diabólico entre alguns elementos
do Ministério Público e alguns meios de comunicação social constitui um ataque
terrível aos mais básicos direitos individuais. Neste infame tribunal não há
presunção de inocência, as pessoas são condenadas sem sequer se poderem
defender.
É evidente que existem casos em que estas coisas acontecem por razões
político-partidárias; outros, para se condenar na opinião pública alguém que não
se consegue condenar em tribunal, as condenações por convicção, que infelizmente
não acontecem só na praça pública; outros para pôr em causa a classe política em
geral; outros para ameaçar vozes incómodas; outros por motivos meramente venais.
Todos eles, no entanto, profundamente atentatórios ao Estado de direito e aos
mais fundamentais direitos.
Tem havido demasiada gente a pactuar com as constantes quebras de sigilo nas
investigações e a embarcar em julgamentos na praça pública.
Sim, devem ser os políticos a não pactuar com este tipo de situações. Devem
ser eles, por nosso mandato, os primeiros a defender a lei e o Estado de
direito. Deve ser o sistema de justiça, juízes, procuradores e polícias a lutar
para erradicar as ervas daninhas do seu seio. E, claro, os meios de comunicação
social não podem continuar a colaborar nesta vergonha.
Mas mais do que qualquer operador político ou judicial, devemos ser nós,
cidadãos, a não colaborar com toda esta indignidade. Bem sabemos que temos sido
demasiadas vezes cúmplices de calúnias, boatos e difamações. Mais: temos sido
demasiadas vezes juízes dos nossos suspeitos favoritos.
Temos de ser nós, cidadãos, a exigir que os julgamentos sejam feitos no local
correcto e por um juiz de direito, não num qualquer jornal e por uma nefanda
coligação entre operadores judiciais e elementos da comunicação social pouco
escrupulosos. Somos nós que não devemos condenar alguém porque nos foi dada a
ouvir uma escuta qualquer ou por nos terem informado que a casa de fulano de tal
foi revistada.
Somos nós que não nos podemos deixar manipular. Enquanto
deixarmos que isso aconteça não há juiz ou político que nos salve. Nem a nós nem
ao Estado de direito.
2-Segundo uma sondagem do Expresso, apenas 7,6% dos portugueses acham que o
Presidente da República deve promulgar o Orçamento do Estado para 2013. As
sondagens são só um instrumento de auxílio à decisão, mas há indícios, digamos
assim, que não devem ser desprezados. É que ao Presidente da República convinha
representar alguém.
Pedro Marques Lopes, aqui