O BARCO DE PAPEL
Era uma vez um barco de papel, que se fez ao mar.
Barco de papel, no meio do mar, estão a ver o que lhe aconteceu? Escangalhou-se à primeira onda.
E regressou à praia. Estatelado na areia, era uma lástima vê-lo.
- Senhor barco de papel, como se sente, depois da aventura?
O barco, todo amarrotado pelo desespero e a humilhação da derrota, esboçou um sorriso. Um sorriso de papel:
- O que sinto vê-se. Não lhe posso dizer mais nada.
Mas o jornalista insistiu:
- Atribui, porventura, o seu naufrágio a alguma causa em especial?
- À minha pouca prática, apenas - respondeu o barco de papel. - E pode escrever que também à minha falta de vocação.
O jornalista ainda:
- Falta de vocação? Interessante. Nesse caso, se pudesse ter voltado atrás, o que teria feito?
O barco de papel ou o que dele sobrara fugiu da pergunta, aproveitando o escorrega de uma onda, que descia da praia. Estava muito cansado o barco de papel. Mas o jornalista, molhando os sapatos, correu atrás dele:
- Não chegou a dizer-me, senhor barco de papel? Por favor, o que teria sido se pudesse voltar atrás?
De longe, quase desfeito, o barco respondeu:
- Avião de papel. É evidente. E hei-de conseguir.
António Torrado e Cristina Malaquias, retirada daqui