quinta-feira, 18 de outubro de 2012

UM PAÍS A FUGIR DO CORTE

Uma coisa boa, para variar: depois do desvario político em torno da Taxa Social Única, o país discute agora os cortes na despesa.

Honra lhe seja feita, a discussão renasceu pela mão de Paulo Portas. Não quer isto dizer que tenha nascido bem. Desde a célebre conferência de imprensa no final de um Conselho Nacional que as ideias do CDS para cortar são tão leves quanto as que ia dando na oposição – na companhia, então, de Passos Coelho. Consumos intermédios, PPP, fundações, empresas municipais, coisas afins.


Somem as parcelas e juntam uns milhões. Poucos e de efeito de curto prazo. De cortes mais dolorosos ninguém fala, no CDS. Percebo porquê: porque esses doem mesmo.

Esta semana tivemos outra bela imagem desse debate que não se faz. O secretário de Estado da Administração pública enviou para os sindicatos uma indicação de que se dispensarão uns milhares largos de trabalhadores a prazo que estão no Estado. Escreveram-se 40 mil. Não se disse onde, como e com que consequências.

Mesmo assim, a reacção não se fez tardar, porque, claro, isso envolveria sempre a Saúde e Educação, para além das autarquias. O resultado era tão previsível que arrepiou: no dia seguinte apareceu Miguel Relvas a esclarecer que o número não era esse, que ficassem descansados. E somou-se mais um partido a fugir do problema.

Falando em fugir: no PS, a despesa é matéria tabu. Não foi assim no último Governo – Teixeira dos Santos e Sócrates (sim, ele) cortaram quando tiveram que cortar, mesmo que empurrados, mesmo que contra vontade, mesmo que tarde. Hoje, fora do Governo, o PSora ignora o tema, ora o exorciza – culpando os ‘fanáticos’ que estão a cortar, também eles empurrados e à pressa; ou até dizendo que cortar é pecado, ainda que não haja Avé Maria para chegar à salvação.

Uns e outros têm uma coisa em comum: a ausência de um plano estruturado. Dou de barato que, neste campeonato, pelo menos os socialistas têm uma vantagem: não têm porque não acreditam nele.

Quanto ao Governo, não tem essa desculpa. Ao que parece está agora a preparar um grande plano, com um objectivo: 4 mil milhões de corte em dois anos. Começam com ano e meio de atraso e logo pelo telhado. Oxalá tenham sucesso – não desejo outra coisa.

A solução Obama
Quero ainda acreditar que este Orçamento e o tal ‘Plano Gaspar’ não vão acabar como os planos de Barack Obama quando, chegado à Casa Branca, percebeu que o défice estava descontrolado. Nessa altura, os seus assessores económicos arranjaram uma solução: três cortes simbólicos de meia dúzia de milhões; e uma ordem para que, no Senado, se formasse uma comissão especial onde Republicanos e Democratas indicariam o resto do caminho, que era todo o caminho.

Por cá, cabe a Passos e a Portas mostrar que tinham razão no essencial da última campanha – que era a mudar o Estado que se resolvia. É mais difícil do que pensavam, pois é. Mas é a sua prova de vida.

Retirada daqui