terça-feira, 16 de outubro de 2012

PARA O ANO É QUE VAI SER!


Há clubes que, ano após ano, numa fase adiantada ou mais prematura do campeonato, o dão por perdido mas anunciam a sua convicção de que "para o ano é que vai ser!". 

Na política, ocorre algo semelhante. Ainda há pouco tempo, confrontado com os dados de 2012, Passos Coelho anunciava que para o ano começaríamos a crescer. Isso foi, evidentemente, antes de descer à terra e de ter começado a fazer-nos descer aos infernos. Agora, quando alguém diz "para o ano é que vai ser!" o tom é tudo menos optimista, prenuncia dificuldades, desesperança.

Como se, depois do desastre da TSU, ainda fosse preciso, o Governo transformou o processo de comunicação sobre o Orçamento para 2013 numa trapalhada tal que já ninguém sabe a quantas anda. Fomentou-se um estado de espírito de incerteza e angústia de que as manifestações são a válvula de escape. Se fosse só mau jeito, ainda vá que não vá. É muito pior do que isso, é uma falta de sensibilidade social e de respeito pelos portugueses, em especial os mais desfavorecidos, que raia o descaramento. A não haver uma inflexão de rumo, o PSD tem a obrigação histórica de preparar uma alternativa, pois não temos tempo, e muito menos dinheiro, para eleições.

Com todos os ziguezagues e cambalhotas que o PM e o ministro das Finanças têm protagonizado, é um risco escrever por antecipação sobre o orçamento que vai ser apresentado. Se o chefe do Executivo continuar a ver e ouvir, terá reparado que as simulações feitas com os escalões pré-anunciados contradizem o seu discurso sobre a partilha mais equitativa do sacrifício. É a classe média, incluindo aquela que foi fiscalmente promovida a "rica", a que não apenas continua a pagar a maior factura, como a vê agravar mais, enquanto os rendimentos acima dos 150 mil euros serão os que sofrem o menor aumento percentual. Somem-se alguns absurdos como, por exemplo, um solteiro ser menos penalizado do que quem tem um filho e este menos do que quem tem dois, e somos levados a concluir que, para haver coerência, há muito a corrigir. A não ser que o discurso seja hipócrita e seja mesmo assim que se pretende que seja: nos dois últimos escalões concentra-se o grosso das famílias contribuintes, que são também responsáveis por uma percentagem significativa de consumo, dos quais uma parcela elevada é importada. Ora a lógica de actuação do Governo é a de conter as importações, controlando a procura, e rezar para que os empresários se esfalfem e aumentem as exportações. Com maior ou menor dificuldade, do lado das empresas cumpre-se. Ao Governo resta estrangular, fiscalmente, quem gasta. Incapaz de pôr a sua casa em ordem ou, ao menos, de tornar claras as opções, o Executivo vinga-se nos cidadãos e na economia. Numa perspectiva contabilística não se estão a sair mal: caminhamos rapidamente para o equilíbrio da balança de transacções correntes, isto é, não acumulamos dívida perante o exterior. Talvez por isso, Gaspar tenha, em Tóquio, falado de novas fontes de financiamento da economia que não apenas o recurso aos mercados. Estimular a poupança interna é uma boa base de partida pelo que seria de prever medidas de incentivo ao aforro. Mais uma vez, o orçamento anunciado é incoerente: agrava-se a tributação dos depósitos sem salvaguardar, sequer, as pequenas economias. Resta esperar que, como sucedeu com o IMI, alguém dê pela incongruência.

Estas e outras sugestões são, apenas, medidas avulsas. Remendos. Falta uma visão partilhada que dê sentido a todos estes esforços. Sugeri que se começasse por um pacto tributário comprometendo partidos e parceiros sociais e envolvendo os mais abonados da sociedade. Um pacto sem datas, mas com compromissos: qual a despesa pública, por função, abaixo da qual não se descerá e se está disposto a financiar pelos impostos; atingido um determinado valor do défice quais os impostos que seriam reduzidos e em que proporção; etc. Prioridades e valores, associada a uma informação clara, a cargo de uma entidade da sociedade civil como a Sedes ou a Fundação Francisco Manuel dos Santos. Para que possamos voltar a dizer, com esperança, para o ano é que vai ser!

Retirada daqui