
Quando, ontem, comecei a ouvir a esperada conferência de Imprensa do
regressado ministro das Finanças (esteve 78 dias sem falar, o que deve ser um
novo recorde para um ministro de Estado), só não levantei as mãos como fazem os
assaltados porque estava a conduzir.
O assalto da última sexta--feira,
verbalizado por um primeiro-ministro transtornado, tornou muito clara a dimensão
da tragédia em que estamos metidos. Logo, o esbulho só pode continuar nos
próximos anos. Vítor Gaspar confirmou-o na matiné de ontem.
Como assim? Fácil: vamos pagar mais IRS, as reformas vão levar um corte entre
3,5% e 10%, os subsídios (os chamados rendimentos complementares) dos
funcionários públicos baixarão, a recessão manter-se-á em 2013 (longe vão os
tempos em que Gaspar e Passos apontavam o próximo ano já como um risonho
amanhã), o consumo cairá, o desemprego não parará e o acesso aos subsídios
sociais será mais difícil. Um dia chegarão os proveitos. Chegarão mesmo?
Lá para 15 de outubro, quando o Orçamento do Estado para 2013 for entregue
por Vítor Gaspar no Parlamento, ficaremos a conhecer melhor os pormenores desta
gigante fatura. E o resto das parcelas que a compõem. Sim, porque o alívio que a
troika gentilmente nos concedeu só o é na aparência. Primeiro, porque nos foi
gentilmente concedido tendo como óbvia moeda de troca o brutal aumento da
contribuição para a Segurança Social. Segundo, porque nos obriga, como segunda
moeda de troca, a um brutalíssimo ajustamento para chegarmos a 2014 com um
défice de 2,5%.
Sim, é verdade que viver como vivíamos não era mais sustentável. Porém, essa
evidência não justifica esta estratégia buldózer que, parafraseando D. Januário
Torgal Ferreira, deixará os caminhos repletos de "cadáveres".
Um Governo que leva um ano de existência sem grande contestação nas ruas -
ainda por cima respaldado por uma maioria confortável (a coligação com o PP
começa agora a mostrar as primeiras fissuras) no Parlamento e por um presidente
da República conivente - tem obrigação de fazer mais, muito mais do que
simplesmente esticar a receita até ao limite da fadiga tributária.
Se Passos Coelho estivesse à frente de uma empresa em dificuldades, não se
atreveria a pedir, uma e outra vez, mais capital aos acionistas. Se o fizesse,
seria despedido num instante. O país, parece-me, tem cada vez mais vontade de se
despedir de Passos.
Retirada daqui