domingo, 16 de setembro de 2012

56,7º C - VALE DA MORTE RECUPERA RECORDE DE LUGAR MAIS QUENTE DO PLANETA


El Azizia, Líbia, detinha o título desde 1922. Cientistas de nove países reviram medições e o recorde voltou ao deserto de Mojave, nos EUA.

Não é que viva muita gente no Vale da Morte para reivindicar o título, mas é uma questão de se fazer justiça meteorológica 90 anos depois de um erro técnico. 

A zona de maior depressão do deserto de Mojave, na Califórnia, acaba de recuperar o recorde para a temperatura mais elevada alguma vez registada no planeta. A 10 de Julho de 1913, o termómetro subiu aos 56,7 graus, provam os registos do rancho Greenland, hoje rebaptizado de Furnace Creek.

Em 1922, o recorde foi transferido para El Azizia, na Líbia, face aos 58 graus registados a 13 de Setembro, mas afinal tudo não terá passado da leitura inexperiente de um militar recém-chegado à estação, instalada numa base militar a cargo do exército italiano. O erro foi reconhecido ontem pela Organização Mundial de Meteorologia, depois de uma equipa internacional de cientistas ter apontado cinco defeitos aos registos líbios. 

Na origem da confusão, que pode parecer de somenos mas movimentou cientistas de nove países, está o facto de, na altura, os militares italianos usarem um instrumento já na altura considerado obsoleto, um termómetro “six-bellini”, com origem no século XVIII. Randy Cerveny, investigador da Universidade do Arizona, explicou que quem fez os registos não soube ler o aparelho, que fornece várias informações para temperaturas mínimas e máximas. Assim, naquele dia, a temperatura terá até sido 7 graus inferior, valor muito mais compatível com a meteorologia local e outras medições feitas à época na região envolvente, por exemplo, nas estações meteorológicas na capital, Trípoli.

A investigação foi surpreendida pela Primavera Árabe, em 2010, o que levou a interromper os trabalhos. O director da secção climática do Centro Meteorológico da Líbia, que facilitou as investigações, esteve oito meses sem dar sinal de vida aos colegas. Khalid El Fadli só mais tarde explicou que tinha fugido de Trípoli com a família e só pôde retomar o trabalho quando reassumiu o cargo com o novo governo, em 2011.

Voltando ao Vale da Morte, relatos da onda de calor de Julho de 1913 não abundam. Sabe-se que, durante cinco dias consecutivos, a temperatura superou os 54 graus e que um dos fundadores de uma comunidade mineira vizinha, hoje a cidade-fantasma de Rhyolite, não terá resistido depois de ficar com o carro avariado em pleno deserto. O corpo humano não tolera exposições continuadas acima dos 55 graus e, acima dos 75, o calor é fatal.

Cerveny defende que conhecer o recorde a nível mundial é importante não só para a história da meteorologia, mas mostra que erros do passado podem prejudicar análises com base em projecções em torno das mudanças climáticas. Por outro lado, há aplicações práticas. “Estes dados podem ajudar cidades que existem nestes ambientes a desenhar edifícios adaptados a estes extremos. Saber as temperaturas a que os materiais têm de resistir melhora os produtos. É por isso que tantas marcas têm pistas de teste no tórrido deserto de Mojave.”

Marta F. Reis,  aqui