A minha esperança para o pós-crise, seja isso o que vier a
ser, é de que renasçam valores matriciais que se foram esboroando à conta do
laxismo que se espalhou com o regime do dinheiro fácil.
A saber: o valor do
trabalho e do mérito com base na avaliação permanente das instituições,
organismos, empresas, organizações e associações. Uma avaliação obviamente
impositiva para todos os setores do Estado e que os privados possam reconhecer
como paradigmática a ponto de a acolherem nos seus manuais de boas práticas
societárias.
Ainda não perdi a esperança de que esta crise possa providenciar um superior
grau de vigilância social sobre vários desmandos e maus hábitos, mas confesso
que os sinais que chegam do mundo dos partidos estão longe de ser encorajadores.
O último desses sinais foi o da indicação pelos partidos de três juízes para
o Tribunal Constitucional: um deles já foi retirado pelo PSD e outro, indicado
pelo PS, já foi publicamente posto em xeque pela perspetiva de poder vir a ser
confrontado pelo Ministério Público com decisões tomadas ao tempo em que era
secretário de Estado da Justiça, entre 2005 e 2009.
Se no caso de Paulo Saragoça da Matta não me ocorre outra memória que a de
ter tido um início de carreira de advocacia muito mediatizada - seja pelas
relações com o ex-presidente do Benfica João Vale e Azevedo, seja pelas
regulares aparições como comentador da SIC -, no caso do antigo secretário de
Estado José Conde Rodrigues, de quem não me recordo de todo, o que mais me
espanta é que, independentemente de problemas processuais, não se tenha sentido
a necessidade de observar um período de nojo entre um cargo de execução das
políticas e um novo cargo de vigilância constitucional dessas mesmas
políticas.
Os vários ranchos do folclore mediático já encontraram neste lamentável
episódio a música com que tencionam dançar de braço dado com os políticos. A
saber: a maçonaria, tão em voga.
Porém, os maus-tratos dados nesta semana ao Tribunal Constitucional não podem
ser vistos por esse prisma folclórico. É preciso ir à raiz do mal, ou seja, à
perigosa partidarização de uma instância que é da família da bandeira e do hino
nacional.
No nosso edifício jurídico, cabe ao Tribunal Constitucional zelar pela
conformidade das leis respondendo a pedidos do presidente da República ou
preventivamente por sua própria iniciativa.
Acontece que, fruto da crise, o supremo vigilante da Constituição foi chamado
a analisar e vai julgar da constitucionalidade de normas do Orçamento do Estado
para 2012 relativas a cortes de subsídio e férias dos funcionários públicos.
Normas socialmente muito difíceis de aceitar e que, por isso mesmo, exigem como
nunca que o Tribunal Constitucional seja visto pelos portugueses como à prova de
partidarite.
Manuel Tavares, aqui