Passados 38
anos de abril de 74, estamos aqui reunidos para celebrar. Para celebrar o fim
da guerra colonial, para celebrar a democracia, a liberdade, a fraternidade, o
direito à educação, o direito à saúde, o direito ao trabalho, em fim o direito
a uma vida digna.
Infelizmente,
passados 38 anos, estamos mergulhados numa profunda crise. Desde logo uma
profunda crise económica que faz alastrar o flagelo do desemprego, que priva
grande parte da nossa população do direito ao trabalho, com especial incidência
para os jovens, muitos deles altamente qualificados, cuja única saída é a
emigração. Mas também uma crise económica que está a destruir a classe média
deste país.
Por isso nós
não podemos aceitar que a Comissão Europeia, o FMI falem em políticas de
fomento ao crescimento e nós só vejamos políticas de austeridade. Nós só
vejamos a austeridade que está a destruir por completo o nosso mercado interno
e a levar à destruição sectores vitais da nossa economia, como sejam o sector
da construção e de todas as indústrias que dele dependem, o pequeno comércio,
toda a pequena e média indústria, como se do nosso empobrecimento pudesse sair
algo de bom.
A verdade é
que a pobreza alimenta uma espiral descendente. Sem crescimento, há mais
falências, há mais pobreza, mais pessoas ficarão desempregadas, o estado terá
mais despesa e menos receita, o que só poderá ser equilibrado com mais
impostos, sobre aqueles que ainda não estão no desemprego ou de portas fechadas
e isto levará a mais falências, a mais pobreza. É uma espiral na qual estamos a
entrar e de onde vai ser doloroso sairmos.
Curiosamente,
estive a semana passada em Bruxelas e não ouvi, nem vi sinais da crise, porque
para mal dos nossos pecados esta é uma crise periférica, uma crise que só está
a afetar os países periféricas como a Grécia, Portugal, a Irlanda, a Espanha e
a Itália, que não conseguem sobreviver numa economia global, com uma moeda tão
forte como o euro, devido à sua falta de competividade.
O problema dos países em dificuldades
não está no peso do Estado Social, como defende a direita, nem nos défices
excessivos, como preconizam os alemães, mas sim no desequilíbrio da balança de
pagamentos, porque compramos mais ao exterior do que aquilo que conseguimos
vender, porque importarmos mais do que aquilo que exportamos. Podem cortar no
Estado Social (na saúde, na educação) o quanto quiserem, mas isso não aumenta a
nossa competitividade, antes pelo contrário, porque pessoas doentes ou pouco
qualificadas não produzem mais. Podem continuar a aumentar os impostos, mas
isso não nos torna mais competitivos apenas nos torna mais pobres.
Olhemos para o caso de uma das
indústrias que mais tem crescido nos últimos anos, a indústria dos painéis
fotovoltaicos, que à custa das políticas europeias de incentivo às energias
alternativas tem crescido a ritmos superiores a 20% ao ano. Conseguimos nós
retirar algum proveito disso, não conseguimos, porque os custos dos painéis
desceu de tal forma que toda a produção foi deslocalizada para a Ásia.
Conseguem os alemães tirar algum proveito disto, conseguem, porque os painéis
produzidos na China, são produzidos com tecnologia alemã, porque as pastinhas
de silício e os chips usados para produzir as células fotovoltaicas são
produzidas pela industria de semicondutores alemã e depois exportados para a
China para serem usados na produção dos painéis, e no final os painéis
fabricados por máquinas alemãs, com matéria-prima processada na Alemanha e
montados na China são vendido ao consumidor alemão e ao consumidor português a
preços muito mais baratos do que aquilo que seriam se fossem montados aqui em
Vila Verde.
Este é verdadeiramente o nosso drama,
temos custos de produção superiores aos das economias emergentes e não
conseguimos competir com economias altamente qualificadas. É um problema
estrutural!
Muito foi feito nas últimas décadas
para atacar este problema, dir-me-ão que poderíamos ter feito mais, certamente
que sim, é sempre possível fazer mais e melhor, mas também vos digo que de
forma pacífica, e sem a ajuda de um Plano Marshall, dificilmente um país consegue
passar da indústria do carro de bois para a indústria dos semicondutores, para
a indústria do conhecimento, em três décadas.
Devemos por isso rejeitar todas as
reformas que nos estão a impor? Certamente que não, porque reformar significa
melhor, significa aperfeiçoar, significa tornar mais eficaz.
Mas não confundamos reformar com
destruir e em muitos casos aquilo que se está a fazer é a destruir, é a
destruir por puro preconceito ideológico, ou por desconhecimento. Talvez quem
nunca tenha ido a um Centro de Saúde desconheça aquilo que representa para os
portugueses o Serviço Nacional de Saúde. Talvez quem nunca tenha andado numa
Escola Publica desconheça o que o Sistema Público de Ensino faz pela
qualificação dos portugueses. Talvez quem nunca tenha vivido numa pequena
freguesia rural, desconheça a importância que a junta tem para a comunidade
local. Talvez muitas destas coisas não consigam chegar aos tecnocratas de
Bruxelas que nos administram e nós devêssemos passar a ter na Europa uma
verdadeira democracia representativa, para podermos saber quem nos governa,
para podermos votar em quem nos governa, para podermos ouvir de quem nos
governa qual o caminho a seguir, para podermos ter alternativas. Não existe
verdadeira democracia se não existem alternativas.
Não queria, nem gostaria de terminar
este meu discurso num tom demasiado pessimista. Mas convenhamos que perante a
realidade que se nos depara é difícil não o ser, de qualquer modo estou certo
que como um povo com uma larga história iremos encontrar caminhos para sair
desta situação, e nestes tempos de incerteza a única certeza que me resta é que
o nosso futuro coletivo passa necessariamente pela valorização dos portugueses.
Por isso quando chegarem a casa não se esqueçam de dizer aos vossos filhos que
vale a pena trabalhar, que vale a pena estudar, que vale a pena apostarmos em
nós, porque só esse é que pode ser o nosso futuro.
Viva Portugal! Viva Abril!
Armando Nolasco Pinto
(Membro da Bancada do PS na AM de OB)