quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

EU JÁ VOS ATENDO...

Há muito tempo que não é segredo para mim, pelo menos, que a legislação laboral que temos é anacrónica.

Muitas das leis que compõem a dita legislação laboral em Portugal não só não ajudam ao desenvolvimento de novas empresas, como prejudicam em muito as empresas antigas que se querem adaptar aos novos tempos, para tentarem manter a competitividade nas condições actuais dos mercados.

Este conjunto de disparates em forma de lei é filho dos piores efeitos do PREC pós-25 de Abril e foi construído com base num doloroso equívoco: na relação laboral, os direitos são apanágio do trabalhador e os deveres são próprios do patrão.

Nesta linguagem que eu próprio acabo de utilizar e a que quase ninguém soa estranha, já se nota mais um corolário desses tempos gloriosos: pelas designações dá ideia de que só o empregado é que trabalha, é que é trabalhador. O patrão, por definição, não é trabalhador.

Em tempos de troika existe a ideia, compreensível, de que só as grandes questões é que interessam e têm a relevância suficiente para inverter os números da crise, das nossas exportações e dos nossos défices.

Consciente desse fenómeno deixem-me contudo hoje e aqui remar um pouco contra a maré, mesmo sabendo que vou numa casca de noz a caminho do Oceano Atlântico...

Tenho um amigo que, farto de trabalhar por conta de outrem, decidiu arriscar num negócio próprio. Surgiu-lhe uma oportunidade de iniciar uma loja num shopping do Centro do país e deitou mãos à obra, constituindo uma pequena empresa e começando a contratar pessoal.

Como o negócio era novo e nunca visto nessa localidade e o know how e a bolsa do meu amigo eram pequenos, resolveu fixar o tempo da experiência em seis meses. Se a coisa fluísse, depois logo se via.

Para assegurar o funcionamento da loja nos horários alargados do espaço contratou cinco pessoas, que arrancou do desemprego oficial ou oficioso e a todas elas prometeu seis meses de trabalho pelas razões já aduzidas e de que a todas deu devida conta.

Nas conversas mantidas com cada pessoa contratada ficou claríssimo que a loja estaria aberta seis meses e que só continuaria caso se verificassem em simultâneo duas condições: a exploração ter resultados positivos desses seis meses, ou pelo menos promissores, e o senhorio do espaço aceitar manter as condições de cedência da loja negociadas, também a título experimental, para o referido semestre.

Nestes pressupostos e porque esse pequeno empresário sempre gostou de tudo "by the book", que é como quem diz sem habilidades, foram formalizados contratos a termo certo com todas as pessoas contratadas.

Passado o meio ano, a conclusão indesmentível foi a de que o negócio não teria qualquer viabilidade nos moldes ensaiados e por sua vez o senhorio também já tinha outros projectos para o espaço.

Fracassada a experiência, a primeira coisa que o meu amigo quis fazer foi contas com o pessoal, apesar do prejuízo que tinha acumulado.

Pediu as contas finais e ficou de cara à banda quando lá viu em todas elas uma parcela significativa referente a uma suposta "indemnização pelo despedimento" (?).

Na verdade, se o contrato havia terminado no termo certo combinado a que se referia a indemnização? Que despedimento era esse?

Pois, os que não sabem fiquem a saber se fazem favor. A nossa magnífica lei laboral prevê que o empresário que arrisca num novo negócio tira do desemprego meia dúzia de trabalhadores, combina com eles seis meses de trabalho e cumpre escrupulosamente tudo o que combinou, mesmo com o negócio a correr pelas ruas da amargura, quando chega ao fim, ainda tem de pagar a cada trabalhador mais três dias por cada um desses seis meses combinados. A título de uma indemnização que ninguém é capaz de explicar o que é que está a indemnizar!

Continuem assim e depois queixem-se do abuso dos recibos verdes e do flagelo da economia paralela, que, pela parte que me toca, eu já vos atendo...

Manuel Serrão, aqui