segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

AVENTAIS PARA DISTRAIR

1. Por muita reflexão, investigação e conhecimento sobre um dado assunto que tenhamos, nunca chegamos a realmente conhecer as reais motivações de muitas decisões que são tomadas.

Sejam das outras pessoas ou mesmo nossas. A verdade é que a possibilidade de conhecermos na íntegra o que está por detrás dum processo decisório é muito escassa. Sofremos todos as mais diversas influências, algumas de forma consciente outras de forma inconsciente.

Pertencemos a grupos mais ou menos organizados.

Dependemos de amores e ódios que não dominamos. Obviamente, os políticos não são excepção à regra. Por muitas leis sobre incompatibilidades que se façam, por muitas obrigações de declarações de interesses que se imponham, por muito escrutínio a que esteja sujeita a actividade política, existirão sempre zonas que o público nunca chegará a conhecer. Algumas destas normas são úteis e ajudam a alguma transparência, outras, infelizmente, são apenas consequência do voyeurismo doentio que se vem instalando e do completo desrespeito pela esfera privada. Porém, no limite, ficamos sempre dependentes da nossa visão pessoal dos homens e do mundo que nos rodeia. Dividimo-nos, em grande parte, entre aqueles que acreditam que as decisões políticas são tomadas em função do interesse geral - concordemos ou não com elas - até prova em contrário e os que assumem logo à partida que por detrás de cada tomada de posição política está apenas o interesse pessoal ou o de um grupo. É, provavelmente, esta a diferença entre um céptico e um crente. Ou entre um optimista e um pessimista.

2. Tenho poucas dúvidas sobre em que é que muitas lojas maçónicas se transformaram ou o objectivo para que foram criadas. Conheço demasiadas pessoas que se tornaram maçons, não por qualquer tipo de vontade de aperfeiçoamento pessoal, de reflexões sobre democracia e liberdade, preocupações filosóficas, mas por razões bem mais prosaicas. O que se me afigura claro é que muitas lojas maçónicas são apenas uma espécie de clubes. Com a dignidade, por exemplo, do extinto grupo da sueca (uma rapaziada que se encontrava para tratar de assuntos...), dos tempos do cavaquismo, com uns rituais apatetados e uns sinais mais próprios dum grupo de adolescentes do que de gente supostamente respeitável. Os objectivos são os mesmos duma qualquer outra agremiação do género: troca de favores e os mais variados conluios visando a obtenção de vantagens para os seus membros.

3. Toda esta conversa para chegarmos a uma das polémicas desta semana sobre os relatórios relativos às irregularidades nas organizações de segurança do Estado. Subitamente, a discussão passou do fundamental para o acessório. Trocou-se a vontade de avaliar os actos de quem tem a responsa- bilidade de zelar pelo bom funcionamento desses órgãos pela discussão patética de quem é ou não é duma loja maçónica. O que importa saber é porque diabo um primeiro-ministro mantém em funções gente que sabia - ou devia saber - da autêntica bandalheira em que se transformaram os serviços de inteligência portugueses. Como é possível um primeiro-ministro não despedir no acto as pessoas que fizeram relatórios internos que mais pareciam histórias da carochinha? Como é que um homem como Jorge Silva Carvalho, que alegadamente utilizou os serviços do Estado para o interesse duma empresa privada, primeiro como responsável dos serviços e depois já como quadro dessa empresa, esteve por um fio para ser o superdirector do SIS e do SIED? De que é que está à espera o Ministério Público para iniciar uma investigação? Porque é que as pessoas que denunciaram os crimes que se passavam, e provavelmente se passam, nesses serviços são afastadas e os que pactuaram com a infâmia são promovidos? Porque é que as declarações de Marques Júnior e Bacelar Gouveia, que praticamente admitiram não haver fiscalização rigorosamente nenhuma a estes serviços, não têm consequências?

4. É-me rigorosamente indiferente se gestores de uma empresa, políticos ou empresários se encontram de avental vestidos, ou todos nus, a conspirar numa qualquer casa. Preocupa-me, sim, saber, no caso de um político, se na prossecução da sua actividade se guia segundo critérios do seu entendimento de interesse público ou apenas em função do objectivo de um determinado grupo ou do seu próprio interesse pessoal. Preocupa-me não saber a resposta para todas estas perguntas relativas aos serviços secretos. O fundamental é saber como é que os nossos representantes actuam face a tão grande escândalo que põe em causa a segurança do Estado e dos cidadãos. O resto são conversas para enganar tolos.

Por decisão pessoal, o autor do texto não escreve segundo o novo Acordo Ortográfico

Pedro Marques Lopes, aqui