Uma breve retrospectiva dos últimos 30 anos mostra que Portugal tem tido sempre um futuro muito promissor para acabar, sempre, por ter um grande futuro atrás de si. Já nos propusemos ser a Califórnia, o Silicon Valley e a Florida da Europa.
Já sonhamos ser como a Finlândia ou como Singapura e até, quando estava na mó de cima, como a Itália. Portugal era demasiado pouco para nós, povo de navegadores e descobridores que deram novos mundos ao Mundo.
Na realidade pudemos ser sempre algo mais do que o que éramos graças aos fundos europeus, como já antes também o havíamos sido mercê das remessas de emigrantes ou da exploração das colónias. Recuando na história, o ouro do Brasil ou as especiarias das Índias não terão tido, na sua essência, um papel muito diferente.
Umas vezes por mérito e iniciativa, outras vezes por recurso e expediente, fomos conseguindo angariar recursos que permitiram que da lei da vida nos libertássemos. E fomos vivendo a nossa vidinha, mais preocupados com o dia-a-dia do que com o futuro que, com zelo, depositámos nas mãos de Deus ou dos profetas das várias versões, mais ou menos tecnológicas, do eldorado português. Viciámo-nos no sonho até acordarmos no meio de um pesadelo que nos recusamos a aceitar como a realidade. Ter de viver com os próprios meios é algo que temos dificuldade em admitir. Causa-nos espécie, e mesmo indignação, que os outros não percebam o futuro brilhante que se nos abre e, por conta dele, nos continuem a emprestar. Já em desespero, disparamos culpas para todos os lados, e recaímos no sonho. Há os que continuam a viver fora da realidade e a construir cenários mirabolantes, feitos de mais despesa pública compensada por uma expropriação de uns míticos ricos à moda antiga, sentados à espera de serem desapossados, que não existem mais. E há os que imaginam que um novo cavaleiro andante, chamado mercado, trazendo nas mãos o novo livro sagrado da oferta e da procura, chegará para nos resgatar, a cavalo nas exportações.
Não efabular sobre o que fomos, somos ou seremos, contar com as próprias forças, por mais Velho do Restelo que pareça, é a postura que se exige. Talvez agora, por más razões, ambicionemos a mudança, começando por readquirir a reputação de sermos capazes de cumprir com as nossas obrigações. É condição para tudo o resto. Vai custar, tanto pelo que teremos de pagar como pelo que deixaremos de poder gastar. Se cumprirmos, é provável que um plano bem fundamentado, subscrito pelos partidos do governo e pelo PS, apoiado pelo Conselho Económico e Social e patrocinado pelo presidente da República possa permitir-nos ganhar algum tempo no caminho do reequilíbrio das contas, evitando rupturas sociais dramáticas. Qualquer que seja a opção política, a dignidade humana há-de ser prioridade absoluta. A rede social de apoios aos mais fracos e desfavorecidos, especialmente aos idosos, não pode ser posta em causa. Para que não haja abusos, é importante que quem dela frui saiba os custos da Educação e da Saúde o que evitará, também, que o Estado pretenda substituir-se a quem presta esses serviços mais capazmente. A subsidiariedade rima com solidariedade e, embora haja quem desconfie, com eficiência.
Estrategicamente, porém, o combate à pobreza faz-se crescendo. A aposta nos mercados externos e nas exportações é, num país pequeno e a atravessar uma fase de contracção, escolha mais do que acertada mas não salvífica. No imediato, ficamos na dependência dos "humores" da conjuntura internacional, que não se afigura a mais propícia. Com a actual estrutura produtiva e empresarial, a diplomacia económica só não basta. Vai ser preciso fazer opções difíceis. Não inventar: aqui, o passado antecipa o futuro. Há quem tenha provas dadas e quem se limite a prometer. Avaliar. Recusar o Portugal dos pequenitos dos grupos de interesse, mas ousar escolher parceiros, descentralizando. E arriscando no que é verdadeiramente novo, mas com pés para andar e não mero sucesso mediático ou história de encantar.
Alberto Castro, aqui