As previsões da Comissão vêm demonstrar que a Europa estagnou.
A vida banal das pessoas normais é muito parecida com a vida das instituições. Vejam-se os casais normais, que em regra só se decidem finalmente a divorciar-se muito tempo depois de o assunto que os levou ali ter acabado.
É uma dilação compreensível: falar na coisa é um aborrecimento, dá imenso trabalho, muitas vezes há crianças, a casa para pagar e, o que não é mais agradável, torna-se inevitável explicar o assunto a demasiada gente.
E tem de se mudar de sofá, comprar um frigorífico novo, vender o carro e eventualmente passar a andar nos comboios da Linha de Sintra. Depois é incrivelmente aborrecido uma pessoa ser obrigada a contar ao Silva da frente que o nosso marido já não é o nosso marido (e este cavalheiro é só um amigo).
Se isto acontece na vida das pessoas normais, porque não haveria de acontecer na das instituições, compostas por pessoas vulgares, e também nas instituições supranacionais, onde estão pessoas de origens totalmente diversas mas que partilham as fraquezas de toda a humanidade?
Em parte, é isso que explica que a União Europeia esteja neste momento a fingir que ainda funciona como uma família enquanto, em simultâneo, continua a cavar o fosso da desagregação que há-de vir a ser assumida um dia destes. Claro, existe o hábito, o medo do desconhecido, o terror do infortúnio económico, etc. – mas a relação europeia, tal como existe, efectivamente já não funciona. É o chamado “casamento de fachada”, aquilo por que os casais que têm o divórcio como destino passam até ao dia do juízo final.
As previsões económicas da Comissão Europeia vêm demonstrar aquilo que já foi preanunciado: a Europa estagnou e o orçamento ontem discutido no parlamento vai ser tão bom para a economia portuguesa como os pacotes de austeridade sucessivos foram fantásticos para a economia grega. Junte-se a Itália à beira da implosão, acompanhada de perto pela França e pela Espanha, e o cozinhado da destruição de uma zona económica torna-se evidente. Como não existe acordo para utilizar as soluções que poderiam aguentar o casamento, é inevitável que um dia destes vá tudo pelos ares.
As notícias desta semana – veiculadas pela Reuters e pelo “El País” – de que Merkel e Sarkozy estão a redesenhar uma União apenas com base nos países que aguentam um euro forte – são um sinal bastante claro de que, a bem ou mal, a Europa como a conhecemos está a ruir. Ainda vai tardar o dia em que será preciso anunciar formalmente o divórcio aos vizinhos. Habitualmente, as pessoas e as instituições resistem até ao limite.
Ana Sá Lopes, aqui