segunda-feira, 23 de maio de 2011

A PALAVRA PROIBIDA DESTA CAMPANHA: RENEGOCIAÇÃO.

A palavra que sempre aparece associada à dívida irlandesa, grega e portuguesa em todos os textos que por esse Mundo se vão escrevendo tornou-se numa palavra proibida no debate político português: renegociação.

As contas são simples e não deixam enganar: é virtualmente impossível pagarmos a dívida acumulada e a que, para pagar a que já temos (e recapitalizarmos os bancos), acabámos de contrair.

Mesmo cumprindo todo o programa da troika tal não acontecerá. Os nosso credores sabem disso e preparam-se para a renegociação que virá. Apenas querem ganhar tempo.

A verdade é esta: daqui a uns anos ou estaremos a pedir mais dinheiro emprestado para pagar os juros - olhem para a Grécia -, ou estaremos a não pagar ou estaremos a renegociar.

Mas, em Portugal, quem ouse falar do assunto é chamado de radical, irrealista, caloteiro e irresponsável. E, no entanto, são os que se recusam a debater o inevitável que merecem cada um destes adjetivos.

Radicais, porque acreditam que é da destruição da nossa economia e daquilo a que chamam de "regime" que nascerá a solução para os nossos problemas. Os ultras do liberalismo económico repetem o discurso que antes era mais comum na extrema-esquerda: sobre as ruínas da sociedade antiga nascerá o homem novo e deste tempo nada sobrará a não ser uma memória distante de um "Estado gastador" e dos privilégios dos "direitos adquiridos".

Irrealistas, porque qualquer economista ou político sério sabe que nem em circunstâncias diferentes, com melhor situação económica, se conseguiria pagar esta dívida, com estes juros e estes prazos. Quanto mais num momento de crise internacional, quando os estímulos públicos ao crescimento nos estão vedados, se advinha uma recessão e se sabe que as receitas fiscais cairão e as despesas sociais, mesmo com todos os cortes, aumentarão. Olhe-se para os números da Grécia, um ano depois da "ajuda" externa, e aprenda-se alguma coisa.

Caloteiros, porque esses é que pedem emprestado em condições que sabem que nunca poderão cumprir. Na realidade, tal como na economia doméstica ou nas empresas, só quer renegociar a dívida quem a tenciona pagar. Os caloteiros, esses, enganam os credores e enganam-se a si próprios, adiando a confissão das suas dificuldades até ao momento em que o inevitável se impõe.

Irresponsáveis, porque tencionam empurrar o problema com a barriga. Alimentam uma bola de neve: pedir emprestado para pagar o que se pediu emprestado para pagar o que se pediu emprestado para pagar o que se pediu emprestado. Não percebendo que a única forma de quebrar este ciclo vicioso é garantir crescimento económico. Podem cortar toda a despesa do Estado, que os juros da dívida continuarão a aumentar se não combatermos o nosso verdadeiro problema estrutural: a divida externa, sobretudo privada. E que só há uma forma de a reduzir: crescer e poupar. Não há crescimento com políticas públicas recessivas. Não há poupança com uma austeridade cega e desvairada.

Não estaremos pior daqui a uns anos porque era inevitável. Estaremos pior porque aceitámos a cartilha ideológica da moda no lugar do debate sério sobre a nossa economia. E esse debate sério inclui a proposta proibida: renegociação da dívida. Quanto mais tarde menos útil ela será. E quando os credores a quiserem fazer já de pouco nos servirá. A nossa economia será uma ruína. Diz-se: renegociar dará mau nome ao País. Imaginem o nome com que ficaremos quando não conseguirmos pagar de todo.

Daniel Oliveira, aqui