Na noite em que Sócrates já pôde abrir a boca, depois do negócio fechado com a Troika, fê-lo com tal contentamento que pareceu bendizer a hora em que o FMI aterrou em Lisboa para resgatar um país em ruína.
Depois de tanto o ter diabolizado e resistido ao único remédio que nos pode safar, se tivermos juízo de uma vez por todas, mudarmos de vida e de políticas desastrosas, que nos levaram a este beco, cuja saída foi entregarmos o país, comparado pelos ingleses como uma “casa de meninas” (segundo Camilo Lourenço em conferência no Hotel Paraíso, organizada pelo Jornal da Bairrada) e o resto dos trastes à tutela do FMI, BCE e Comissão Europeia.
Sem pudor, anunciava o melhor dos mundos: é um bom acordo, não vai haver corte nos 13º e 14º meses (já comidos pelos impostos), corte na função pública, nas pensões mais baixas. Era o grande salvador, como se não fosse a Troika a ditar as regras apertadas. Enquanto isso, o ministro, T. dos Santos, fez figura de corpo presente (ou de outra coisa), mudo e hirto, com sobrolho carregado, rosto fechado, lábio caído, trombudo. Talvez a pensar que, afinal, ele é que iria ser o mau da fita ao ter que anunciar no outro dia o inferno.
O povo, sempre pronto a perdoar e a esquecer quem o engana, suspirou de alívio. Caramba, pelo menos não iam baixar as pensões dos mais pobres e os funcionários públicos iam receber os costumados subsídios, a austeridade não era assim tão gravosa…Tudo voltava ao paraíso de Sócrates, que recebia um balão de oxigénio do FMI.
A quem o ouviu, até parecia que havia sido um grande êxito do governo, quando, semanas antes, JS alardeava que não tinha poderes para negociar. Foi um discurso eleitoralista do secretário-geral do PS, um golo em cheio no intervalo do Barcelona-Real Madrid. Oxalá não venham a surgir mais esqueletos daqui a uns meses escondidos nos armários. O jornalista Camilo Lourenço não descarta essa hipótese…
Armor Pires Mota, no 'Jornal da Bairrada' de 12 de Maio de 2011