É sobre a realidade mais abjecta e crua que a escrita de Virgílio Liquito por norma se debruça. Ex-Creta é um exemplo. Ao deter-se sobre as particularidades da vida que a generalidade dos autores se recusa sequer a abordar, temendo ferir os mais sensíveis ou talvez apenas por receios congénitos, Liquito concretiza uma aproximação ao real que, por muito trangressora e pouco convencional que seja, assegura amiúde momentos de assinalável deleite para o leitor.
“Vida como a minha só a dos vermes. Sensibilidades dentro circulando sem tibiezas, fiéis entre si e conflituosas contra o exterior”, escreve o autor já nas derradeiras linhas.
Como bem sublinhou Alexandre Teixeira Mendes na apresentação do livro, é visível “na escrita de Virgílio Liquito, a sua conexão com a experimentação no escuro, a ‘travessia do fantasma’, a secreta patologia”, características estas que desembocam num ‘material inconsciente – não passível de interpretação e de recordação – que aparece então como ‘actuação-repetição’ de um passado esquecido: ‘inusitado puzzle’”.
Nascido no Porto em 1950, Virgílio Liquito, na singular definição do próprio, “sua milhos nos seus trabalhos sísifos com a pujança de baratas indiferentes ao quotidiano estulto dos calcadores. Raramente usa sapatos. Detém-se no pelo dos gatos onde encontra a semiótica sensorial para olhar a vida com desprezo”.
Sérgio Almeida
EX-CRETA
Virgílio Liquito
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