segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

O CALCULISMO

Como se previa, a moção de censura deixa o Governo tranquilo e, se alguma mossa provoca, é mesmo no Bloco, que sente, agora, necessidade de uns comícios diários para explicar a "bondade" do gesto.

Mas a moção trouxe alguns dados novos. O PCP, por exemplo, clarificou posições e já veio dizer que não está disponível para apoiar moções da Direita. Se isto for para levar por diante, o que quer dizer é que o PS resiste pelo menos até ao próximo Orçamento.

O PSD anunciou a abstenção e aproveitou para ser claro, obrigando o PS a governar e mostrando-se disponível para fazer as "reformas que o país precisa e o PS não quer".

Assim se vai andando, quase dando razão aos belgas, que estão sem Governo vai para um ano. Sócrates desmultiplica-se em presença e em iniciativas, mas os ministros ou desapareceram ou só se vêem a seu lado. A verdade é que o Governo se aguenta à conta do calculismo dos partidos, incluindo o partido do Governo, ao qual interessa aguentar o mais possível dando a imagem de que não desiste, mesmo nas condições mais adversas. Sejamos claros: não há muito mais a fazer. O programa duro que o PS pôs em marcha é, no essencial, o mesmo que o PSD poria. O que nos faz falta hoje é precisamente o mesmo que nos fez falta nas últimas eleições: estabilidade. Nessa altura, os partidos não chegaram a um acordo e o presidente nada fez nesse sentido. Agora, os partidos fazem contas para actos eleitorais e continuam sem estar preparados para negociar entre si. O próprio primeiro-ministro mantém a irredutibilidade de sempre.

Mas, se os partidos não querem dar o primeiro passo, por que continua o presidente sem exercer a sua influência? Por que permite, até, que se diga que poderá ser ele a abrir a porta a eleições, demitindo o Governo, acto que verdadeiramente contrariará o seu espírito, tido por conciliador?

Sócrates salva-se enquanto for havendo algumas boas notícias, apesar das más notícias que sempre sugem. Mas o controlo do défice e a taxa de juro conseguida para os empréstimos são a pedra de toque. Passos Coelho vai esperando. Ele sabe que poderá não ter a maioria - mesmo com o PP - e sem isso não há estabilidade para governar.

Os mais novos, os que "estudaram para ser escravos", preparam uma manifestação. Com o descontentamento a crescer, já não é apenas o PS e o Governo que estão em causa, mas o próprio regime. Não será isto suficiente para o presidente e os conselheiros que o rodeiam prepararem um encontro entre partidos e parceiros sociais? Poderá o país continuar a viver sempre sob o espectro de uma crise política que mais agravará a nossa condição económica?

PS - Dois sinais, quase marginais da crise que vivemos: esta semana, quase ao mesmo tempo, o banqueiro Ricardo Salgado teceu comentários duros e nada abonatórios sobre declarações do governador do Banco de Portugal; o líder da Jerónimo Martins acusou o Governo de mentir e considerou uma bênção a possibilidade de o FMI intervir em Portugal. Esclarecedor.

José Leite Pereira, aqui