O presidente do Sindicato dos Funcionários Judiciais, não sabe precisar quanto é que estes casos poderão custar ao Estado, "até porque cada caso é um caso".
Um processo comum pode custar centenas de euros. Basta as partes interporem recursos para o custo subir. Mesmo sem precisar números, Fernando Jorge diz ser óbvio que os atrasos na justiça têm um "custo elevado". Na sua opinião, devia haver "uma reforma legislativa que permitisse repensar o que é digno de ser tratado em tribunal" e ainda agilizar os processos.
Amêndoas e 'whisky': 2 anos (Matosinhos)
O advogado de Matosinhos, Filipe Melo, representou também o jovem Bruno Silva, 18 anos, julgado em Fevereiro deste ano por um colectivo por causa do furto de um pacote de amêndoas e de uma garrafa de whiskey no Minipreço. Da data dos factos, 15 de Março de 2008, à sentença, a 22 de Março deste ano, passaram dois anos. Bruno foi absolvido. A 19 de Setembro de 200, o Tribunal da Relação de Lisboa julgou improcedente um recurso do Ministério Público (MP). O MP queria avançar com um processo comum por furto simples, de natureza semipública, contra um jovem de 18 anos que levou cinco chocolates Milka, no valor de 4,85 euros, de um supermercado, a 6 de Março de 2007. O Tribunal da Relação do Porto deu razão à juíza de pequena instância criminal que considerou que a "coisa furtada é de valor diminuto" e "destinada à satisfação imediata" do jovem arguido. E que, sendo assim, o furto simples assumia a natureza de crime particular. Os desembargadores consideraram ainda, nos fundamentos do acórdão, que este "atribulado processo" teve uma "tramitação" que "contraria todas as orientações da política criminal orientadas para a pequena criminalidade". Leia-se, orientações de rapidez processual.
Casaco ainda mais podre (Porto)
É um dos mais recentes casos insólitos a ser decidido no Tribunal da Relação do Porto e envolve o destino a dar a um casaco velho e podre. Um casaco de bombazine "em estado de infecta desagregação" foi apreendido a um homem que, a 28 de Outubro de 2009, foi condenado pelo Tribunal de Amarante pelo crime de condução ilegal. A peça tinha sido furtada a 22 de Março de 2006 e acabou por ser apreendida a 5 de Abril do mesmo ano. O Ministério Público (MP) decidiu pelo arquivamento do crime de furto a 15 de Junho de 2009 e, a 18 de Janeiro do ano transacto, o dito casaco foi levado para tribunal para ser identificado pelo legítimo dono. Como o dono da vestimenta tinha falecido há três anos, foi decidida pelo juiz a destruição da vestimenta devido ao "estado de infecta desagregação". No entanto, o MP considerou que o casaco deveria ser restituído a quem de direito e recorreu, alegando, inclusive, que o juiz tinha violado "o disposto nos artigos 109.º do CP e o 186.º do CPP". A conclusão do processo tardou, mas acabou finalmente por chegar: a 29 de Setembro último, quatro anos após a apreensão do "complicado" casaco de bombazine, o Tribunal da Relação do Porto decidiu, por unanimidade, dar o recurso como improcedente...
Creme de beleza furtado (Porto)
Mas casos insólitos é coisa que não parece faltar nos tribunais portugueses. Invadem os tribunais de pequena instância e de primeira instância, mas também entopem os tribunais superiores, devido aos recursos. Um dos casos que acabou por se tornar mediático é o inesquecível furto de um creme de beleza num supermercado da cadeia Lidl. A 21 de Junho de 2007, o Tribunal Criminal do Bolhão, no Porto, absolveu uma septuagenária do furto de um creme de beleza, avaliado em 3,99 euros, do supermercado Lidl. Os factos ocorreram a 18 de Outubro de 2005. Para além do insólito, um mistério: já depois de Maria Martins ter sido levada a julgamento, o próprio supermercado entregou, a pedido do tribunal, um talão comprovativo de que, afinal, o creme tinha sido pago. Na sentença, o tribunal não deixaria de mencionar a "coincidência estranha" de o talão referir somente a compra do creme naquele dia às 11.54, quando a senhora tinha procedido a outras compras, registadas pela caixa. Em 2006, também foi julgado no Tribunal da Relação do Porto o furto de uma embalagem de queijo fatiado, no valor de 1,29 euros. Nesse mesmo ano, juízes da Relação mandaram para julgamento uma mulher que levara quatro queijos de vaca do supermercado sem os pagar.
Galinhas... absolvidas (Coimbra)
Em 2003, um casal de Vilamar, Cantanhede (Coimbra), queixou-se que os animais dos vizinhos não os deixavam descansar durante a noite. Após duas sessões de julgamento, com audição de testemunhas e uma ida à capoeira, o juiz considerou que as galinhas poderiam ser absolvidas, deixando claro que o canto dos galos provocaria apenas "algum desconforto ou incómodo de reduzida intensidade". O casal - também possuidor de instalações próprias para criar frangos e galinhas - ainda tentou recorrer. O Tribunal da Relação de Coimbra negou o recurso à sentença do Tribunal de Cantanhede com uma fundamentação eloquente: "Como dizia nas suas lições o prof. Antunes Varela, todos temos de pagar algum preço por andarmos vivos." Outro caso caricato foi, em Abril de 2009, no Tribunal da Maia, o julgamento de um homem acusado de furtar duas galinhas. O julgamento terminou um minuto após ter começado com a desistência de queixa do lesado e a anuência do arguido. O próprio lesado, apesar da convicção de que teria sido o arguido a furtar os animais em Outubro de 2007, considerou que "não valia a pena perder tempo". Manuel Costa, 61 anos, anunciou que iria deixar cair a acusação, rotulando a situação como "uma palhaçada".
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