quinta-feira, 15 de maio de 2014

O DOM DA VIDA

Esta semana, a igreja portuguesa está a celebrar o dom da vida sob o lema “gerar vida, construir o futuro”

É altura de agradecermos o dom da vida, a  disponibilidade dos pais, o amor enorme de nossas mães. É tempo de gratidão e lembrar as lições que nos dão ou nos deram. Mas não vimos falar da consabida falta de políticas dos nossos governantes, no sentido de ajudar as famílias a gerar vidas e assim construir o futuro. 

Os efeitos nefastos estão à vista e as causas também. O diagnóstico está feito. Hoje, queremos associar a esta iniciativa de consciencialização o valor da vida humana em muitas situações. Estamos hoje perante graves faltas de respeito pela vida no sentido mais lato. Hoje viver é cada vez mais um risco, um desafio. 

E já não falamos da falta de relações amistosas entre famílias e gerações, entre novos e velhos, que são cada vez mais descartáveis. Há cada vez menos o culto da família e o gosto de saber de outiva as histórias do seu passado, ouvir os seus conselhos. O diálogo à lareira ou à mesa esfuma-se na pressa de cada um viver a sua vida, longe das raízes. 

Não se pratica a cultura do encontro e da partilha, da proximidade e da prestabilidade e muito menos a valorização de cada um nas suas diferenças e nas diversas fases. Não são poucos os casos de filhos ou familiares que despejam, em tempo de férias, e não só, os seus idosos nos lares, nos hospitais. Fugindo às suas responsabilidades, ali os abandonam à tristeza e solidão. 

Quando não são despejados na rua, no vão da escada. Estamos a caminho da selva a níve. E neste vergonhoso patamar de desprezo pela vida do outro não estão só os de pouca educação e rasa cultura, estão os que tiveram acesso aos diversos graus de ensino e abicharam uma licenciatura. E não são só os velhos que são descartáveis nos dias de hoje, são os namorados, os casais, os amantes, são os familiares e os vizinhos. 

Um mata o outro, com tiro ou à facada sem pestanejar uma só vez. A violência no país vem aumentando. A doméstica também. Mas o Estado também despreza  a vida dos seus, quando no distrito de Aveiro deixa sem subsídios 1.800 crianças deficientes, com necessidades especiais, ou quando os mais pobres não têm dinheiro para remédios.

Armor Pires Mota, no 'Jornal da Bairrada' de 15 de Maio de 2014