Relógios, Banca, queijos e chocolates são quatro marcas do prestígio da
Suíça.
Um quinto referencial é tão ou mais apreciado: o instituto do referendo.
As decisões dos suíços, nos cantões ou na confederação, são por regra
referendadas pelo povo. A Democracia helvética confia nos eleitos para a
governação, mas não lhes permite a libertinagem de poderem colocar-se a coberto
do prazo de um mandato para fazer tudo quanto lhes dá na real gana.
Há sempre um
controlo remoto capaz de ser acionado - bastando no plano estadual a recolha de
100 mil assinaturas para submeter propostas de alteração a leis num prazo máximo
de 18 meses.
A prática suíça tem, supletivamente, essa virtude: os eleitos estão avisados
da impossibilidade de tratar os cidadãos como mentecaptos a todo o tempo.
O aprofundamento da Democracia na Suíça pela via do referendo dispõe de
sinais constantes. E ontem voltou a ser paradigmático.
Um teimoso de nome Thomas Minder está com a falência da Swissair em 2001
atravessada há muito na garganta. A extinção da companhia de bandeira do país
repercutiu os efeitos da crise do transporte aéreo, mas também uma gestão ao
tipo "fartar vilanagem" da qual alguns administradores saíram de bolsos a
abarrotar com muitos milhões. Thomas Minder defendeu a necessidade de criar
regras, os governos suíços foram sendo sempre do contra, mas ontem, por fim,
escancararam-se as hipóteses de mudança das leis.
Quase 68% dos suíços referendaram a necessidade de controlar salários e
atribuição de prémios chorudos aos conselhos de administração das empresas
cotadas em bolsa - encurtando também os mandatos para um ano. Afinal, na Suíça
como noutros países, incluindo Portugal, há gestores a receberem verbas
pornográficas, em detrimento da constituição de reservas nas empresas e
distribuição de dividendos aos acionistas. No caso português, aliás, é conhecido
o escândalo de atribuição de prémios a administradores pelo desempenho de
empresas cujos resultados ficam no vermelho retinto.
Ao resultado do referendo na Suíça - protagonizado pelos mesmíssimos cidadãos
que votaram não há muito tempo a recusa de um aumento dos dias de férias - não é
alheia, naturalmente, uma sede justicialista, eventualmente extremada.
Para todos os efeitos, no entanto, o fundamental é valorizar a autonomia do
povo na tomada de decisões.
A Europa da União e os respetivos países parceiros não perderiam nada em
tornar mais frequente - e efetivo - o referendo dos cidadãos. Organizada segundo
partidos com tendência para se fecharem numa espécie de concha em instinto de
defesa do emprego das cliques, a classe política faz mal em não tornar mais
frequente a capacidade de decisão do povo.
Mais cedo do que tarde cavará a sua
sepultura.
Retirada daqui