Com o falecimento de António Tavares
Simões Capão, por todos conhecido por António
Capão, nome que utilizava para assinar os seus trabalhos, a
bairrada, e de uma forma particular a vila e freguesia da Palhaça e o concelho
de Oliveira do Bairro, acabam de perder um dos seus homens bons.
Natural
do lugar de Arieiro, na freguesia da Palhaça, onde nasceu a 27 de Agosto de
1930, era licenciado pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, tendo
apresentado como dissertação para licenciatura em Filologia Românica uma tese
senominada "A Bairrada - Estudo Linguístico, Histórico e Etnográfico".
Desde
cedo manifestou uma entranhada dedicação ao tema da bairrada nas suas variadas
perspectivas, ao mesmo tempo que consagrou as suas atenções a outros assuntos
literários, históricos e filológicos.
Peregrino
na leccionação em diversos liceus do país e de Moçambique, na Escola do
Magistério Primário de Aveiro e também no Seminário de Santa Joana, por onde
passou deixava sempre uma marca do homem culto e ávido de enriquecer o
espírito. Fez parte do grupo de trabalho para a estruturação dos Currícula da
Formação Superior de Professores do Ensino Básico.
Ao
longo do tempo, proferiu inúmeras palestras e conferências nas várias áreas da
nossa cultura, nomeadamente de carácter profissional, literário e sobre a
defesa do património cultural, tendo igualmente marcado presença nos órgãos de
imprensa, com contos, poemas, criticas literárias e trabalhos de investigação.
Possuidor
de um apreciável talento e dotado de uma perspicaz capacidade de observação
construiu a sua "casa da sabedoria" que se tornou fonte de inspiração
para os trabalhos que iam saindo da sua pena. De entre as suas obras publicadas destacam-se:
· O nomes Populares do Chapim e da Codorniz, 1964;
· Comunicação do XXVII Congresso Luso-Espanhol para o
progresso das ciências, 1964;
· Dante, apóstolo, leigo do catolicismo, 1965;
· O Folclore Religioso em algumas aldeias Portuguesas, 1967;
· Dr. José Pereira Tavares, um grande professor do
ensino liceal - Sua paixão pelo teatro,
1977;
· Freguesia da Palhaça - Contribuição para a sua
monografia (coordenação), 1977;
· Carta de Foral da Vila de Frossos, 1984;
· As Cartas de Foral de Miranda do Corvo, 1989;
· Da Criação , evolução e Encerramento da Escola de
Magistério Primário de Aveiro - 35 anos de labor fecundo, 1989;
· Carta de Foral de Oliveira do Bairro, 1991;
· Bodas de Ouro sacerdotais do Padre Manuel de Oliveira, 1991;
· Relance Histórico-Linguistico sobre a Região da
Bairrada - Influências arábicas,
1992 (vencedor do prémio Literário Região da Bairrada em 1990);
· Relíquias da Tecelagem, 1993;
· A Cultura Popular em Terras de Aveiro, 1993;
· Os Moinhos da Nossa Região - Sua Vida e Decadência, 1995;
· Três Palestras,
1997;
· O meu país
das Libélulas. Leque de Pensamentos, 2005.
Ao nível das traduções realizadas,
registam-se:
· Deixem as Redes e Venham - de René Voillaume, 1977;
· Despertar para Deus (O Despertar Religioso da Crianças) de Danielle Monneron, em parceria
com o P. Dr. José Martins Belinquete , 1986.
Fez introduções literárias para a colecção ‘Clássicos
de Bolso’ da Paisagem Editora sobre autores nacionais:
· Os Meus Amores
(de Trindade Coelho);
· Os Pescadores
(de Raul Brandão);
· As Pupilas do Senhor Reitor (de Júlio Diniz);
· O Livro de Cesário Verde (de Cesário Verde);
· Sonetos (de
Florbela Espanca).
Na imprensa periódica colaborou, entre
outras, com as seguintes publicações:
· "Aveiro e o Seu Distrito" – Aveiro
· "Aqua Nativa" – Anadia
· "Boletim da ADERAV" – Aveiro
· "Mundo da Arte" – Coimbra
· Jornais: "Jornal da Bairrada", "Soberania
do Povo", "Boa Nova", "Correio do Vouga",
“Ilhavense”, “Gazeta do Sul”, "Voz do Norte" - Nampula -
Moçambique, "Diário de Moçambique".
Tambem publicou estudos
diversos onde abordou a história e etnografia regional, etnografia Moçambicana, literatura e linguística, educação, contos, poesia
e crítica literária.
O livro "O meu
país das Libélulas. Leque de pensamentos" é o quadro vivo da sua brilhante
caminhada, recheado de ricas considerações em que revela a sua invulgar
estatura de homem crente, patriota e dedicado à família.
Exímio coleccionador
de selos, moedas, medalhas, conchas, etc., manteve sempre uma estreita ligação
à Igreja Católica e cultivou o contacto com personalidades da cultura como o
grande homem das letras José Pereira Tavares e pintor indo-português Vamona
Ananta Sinai Navelcar. António Capão foi também director do Museu de S. Pedro
da Palhaça.
Em 13 de Junho de
2011 foi eleito como membro da Academia Portuguesa da História, instituição
onde foi solenemente recebido a 12 de Outubro do mesmo ano e onde estiveram presentes
personalidades gradas da vida cultural do país, familiares e amigos que quiseram
associar-se à justa consagração de um dos mais célebres intelectuais
bairradinos do nosso tempo.
No discurso de
agradecimento que proferiu depois de receber o diploma da instituição com que
foi congratulado, António Capão disse: «Ora,
esta criança que nasceu há mais de 80 anos, que descalça pisou solos macios e
barros gretados, que atrelou bois aos tradicionais instrumentos agrícolas e os
guiou, que pegou nas arrabelas da charrua e na rabiça do arado, que estudou e
se licenciou na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, que investigou,
registou e escreveu milhares de páginas, essa criança, sou eu: António Tavares
Simões Capão que, se Deus me der vida e saúde, continuarei a contribuir para o
prestígio da Academia.»
Palavras dignas de um
Mestre, um cidadão exemplar, um professor ilustre e um estudioso incansável,
merecedor de todas as honras pela sua dedicação a áreas como literatura e língua
portuguesa, etnografia, geografia linguística, antroponímia e toponímia.
Pouco mais de um ano
depois, o Dr. António Capão partiu.
Com a perda deste seu vulto, o mundo da cultura ficou mais pobre.