Hoje deu-me para isto: com a manhã a acordar turva e pardacenta e com ameaços de
chuva, resolvi percorrer de uma ponta à outra,
todo o itinerário do troço da antiga E.N. 235 que dentro da cidade de Oliveira
do Bairro está ainda em obra, e que depois de requalificado dará lugar àquilo
que, há quem diga, será uma alameda na cidade.
Finda a viagem, formei a ideia de que
ainda há muito a ‘escabulhar’ até que a obra fique aparentemente concluída, o
que, no entanto, talvez não obste a que este ponto possa ser atingido até final
do próximo mês de Fevereiro, data em que se atinge o prazo dessa execução considerando a segunda prorrogação de um
prazo inicialmente contratualizado para Outubro deste ano, e primeiramente
prorrogado até final de Janeiro do próximo ano.
E se me refiro a uma aparente conclusão
da obra, é porque os responsáveis pela dona da obra já assumiram que, nos locais onde
não há acordo de cedência por parte de proprietários, moradores e comerciantes,
a intervenção apenas incidirá nas áreas de domínio público, independentemente
de este desfecho determinar a descontinuidade de passeios pedonais ou quaisquer
outras anomalias, em prejuízo do interesse público; e ao que é dado ver, essas
situações não são poucas nem irrelevantes, atingindo cerca de 3 dezenas de
situações, a que correspondem 13% das situações em que não foi possível
concretizar os ditos acordos.
A zona do troço 3, que liga a Praça da
República ao Jardim do Padre Acúrcio é, inquestionavelmente a zona nevrálgica
de toda esta obra, não só pelo facto de se localizar no ponto em que a cidade
de Oliveira do Bairro é transversalmente atravessada por todo o trânsito que
circula no sentido nascente / poente e vice-versa, mas também porque é nesta
zona que têm surgido os maiores dificuldades nos contactos com proprietários,
moradores e comerciantes, dificuldades estas a que não é alheia a postura do quero, posso e mando inicialmente utilizada
por quem, em representação do município, estabeleceu os primeiros contactos com
estes munícipes.
De todo o modo, são patentes ao longo de
todo o trajecto, evidências claras de que, na questão das cedências, o
tratamento dado às situações não foi homogéneo, nem imparcial e muito menos equidistante; basta, aliás, analisar
alguns dos muros construídos para se perceber que essa diferença de tratamento
acontece e, pior que isso, nada indicia que seja por acaso que uns muros estão
feitos para ‘suportar pescadores’ ao passo que outros estão feitos para ‘suportar
a Ponte Vasco da Gama’, uma situação em que talvez a identidade dos
proprietários dos terrenos confinantes seja suficiente para explicar essa
diferença de tratamento.
Uma destas situações, um verdadeiro
enigma que até ao momento
nunca foi objecto de qualquer explicação plausível, constituir-se-á mesmo numa autêntica
nódoa nesse grande projecto de regeneração urbana que é a construção da nova
avenida da cidade de Oliveira do Bairro.
A coisa conta-se em poucas palavras: à entrada do troço 1,
logo a seguir ao quartel dos bombeiros voluntários (sentido ascendente),
encontram-se localizadas duas moradias, de construção recente, e cujos muros e
jardins apenas de forma fingida foram tocados em favor do domínio público;
quanto ao essencial, e ao que parece, manter-se-ão inalterados, assim obstando ao
alinhamento que a construção da nova obra trouxe ao local, em resultado do
afunilamento do passeio fronteiro e da inexistência de lugares para estacionamento
automóvel, dando ao local uma aura de intangibilidade e de proteccionismo que
até ao momento nunca foi explicado; há mesmo quem diga que é este, exactamente este,
o motivo pelo qual a nova via não tem separador central em toda a extensão da obra.
Basta, aliás, aceder ao projecto da obra, no local, que a autarquia tornou público (a apenas meio ano do final do prazo de execução!), para se perceber a intenção de deixar intocado o local.
E à falta de explicações oficiais para tal facto, logo a
populaça se encarregou de arranjar justificações. Para uns, mais tecnocratas, o
que motiva a situação é o facto de a solução passar pela demolição de
muros existentes e construção de novos muros, em local mais recuado: para
estes, a situação passou a ser conhecida como ‘o caso das casas do engenheiro’,
uma designação que, é garantido, nada tem a ver com a qualificação académica
dos respectivos proprietários.
Para outros, mais desconfiados dos políticos e da forma
como alguns fazem política, o que dita a inamovibilidade da situação é um verdadeiro
enigma, remetendo para área policial a justificação plausível para tão
intricado caso.
Situações como esta, em que não
há qualquer explicação oficial e aceitável que as sustente e justifique,
explicam claramente a razão pela qual uns tantos já
concluiram que o poder político fascina outros
tantos, desembocando mesmo, quando por estes alcançado, num culto vaidoso e
cego, que esquece rapidamente a razão da sua existência e conduz ao
definhamento da própria personalidade, onde a sede de poder é tão grande que
para se protegerem, os seus sujeitos acabam isolados do mundo e indiferentes à
própria razão.
E assim, valores morais que num
passado muito recente pareciam suficientemente sólidos, vão progressivamente
sendo substituídos por outros, enclausurados numa ética própria assente na
consciência pessoal e exclusiva.
É que só sabe estar na política
quem tem traços de personalidade e de carácter que o vocacionem para a política
ou seja, quem tem uma noção, ainda que mínima, de que estar ao serviço da
comunidade não é fazer da política uma carreira, já que o exercício do poder
não é um fim, mas sim um meio de gestão da res
publica, para, devidamente utilizado, melhorar a vida das pessoas.
Actuações
deste nível, parecem já ser sinais claros da caminhada em passo largo para um
processo de desmoronamento, em que a vida democrática do concelho pode estar a
ser inexorávelmente conduzida.