sexta-feira, 21 de setembro de 2012

'AUTOCARRO DO AMOR' CIRCULOU NA ALAMEDA SEM QUAISQUER SOBRESSALTOS

Por iniciativa do presidente da assembleia municipal, o ‘processo da alameda’ foi incluído na ordem do dia da sessão realizada no passado dia 14.


A esta iniciativa, o presidente da câmara respondeu com uma outra, consubstanciada no convite aos membros dos órgãos deliberativo e executivo para uma visita guiada à obra, visita esta que antecedeu o início da realização da dita sessão e se traduziu na passagem em autocarro por todo o itinerário da dita via.

Como é evidente, ambas as iniciativas se saúdam, mas em relação à do presidente da câmara municipal não pode deixar de evidenciar-se o seu estratégico oportunismo, uma vez que nunca anteriormente tal decisão havia sido tomada em relação a qualquer outra obra, fosse a da nova sede de junta de freguesia, auditório e biblioteca de Oiã, fosse em relação à requalificação das antigas escolas primárias ou aos sete novos pólos escolares (o de Mamarrosa ainda não está em obra), fosse em relação à feira da Palhaça ou à casa da cultura. 

E por isso, apesar de se saudar, esse convite presidencial não pode deixar de ser alocado à integração do assunto na ordem do dia da sessão da assembleia municipal, com o concreto e específico objectivo de esvaziar o efeito da iniciativa do presidente da assembleia municipal e, por tabela, as intervenções dos respectivos membros numa sessão pública, presenciada pela imprensa e por alguns dos munícipes interessados e envolvidos.

Na verdade, a dita visita teve honras de ter sido guiada pelo próprio presidente da câmara, que ao longo de toda a extensão da obra não só deu as explicações que entendeu pertinentes, como esclareceu as (poucas, muito poucas!) dúvidas que lhe foram sendo colocadas pelos viajantes, ao ponto de nenhum esclarecimento ter ficado por dar.

Ao que consta, ter-se-á tratado de uma viagem num ‘autocarro do amor’; mas ao que igualmente consta, muitas questões terão ficado por colocar, designadamente as que envolvem as constantes alterações do projecto, a responsabilidade pelos prejuízos resultantes da execução da obra, as queixas de proprietários, moradores e comerciantes relativamente à falta de informação, a prepotência colocada nas abordagens aos particulares, etc, etc.

De uma forma resumida, e em relação ao que falta fazer, o presidente da câmara terá dito que todas as intervenções em áreas do domínio público serão concretizadas, e que em relação às áreas privadas apenas serão intervencionadas aquelas onde já se chegou a acordo: o que faltou perguntar, é a razão pela qual a aprovação do projecto final desta obra “Requalificação da E. N. 235 - Nova Alameda da Cidade”, ocorreu em 28 de Dezembro de 2006 e, quase seis anos depois ainda há proprietários por contactar e acordos por celebrar, o que não abona nada em favor de um diálogo que se pretendia atempado, por forma a que fosse construtivo e profícuo.

Uma questão que se impunha, tendo em conta que a grande lacuna desta obra assenta na omissão da interacção entre o processo de transformação da cidade e a população, por forma a que a dita transformação pudesse ter tomado na devida conta as debilidades existentes, ajustando-se à percepção e desejos da população, constituindo-se assim como uma resposta eficaz aos problemas identificados e qualificados no seu desenho final, continuando e reforçando o simbolismo e afectividade que esse espaço encerra para a cidade e para os seus habitantes.

Efectivamente, logo depois da satisfação da sua necessidade de emprego, de infra-estruturas e de serviços básicos, o que conta verdadeiramente para os habitantes de qualquer cidade é a qualidade dos edifícios e dos espaços exteriores a que eles dão origem - isto é, o domínio público que pode ser usufruído no dia a dia de todos os cidadãos e dos visitantes. E assim, depois de ter sido anunciada como sendo uma obra que mudaria para todo o sempre a cidade, o que se esperaria desta obra é que, no mais curto espaço de tempo possível, convertesse a sede do concelho numa cidade actual, cativante, atraente, com uma base económica sólida e um ambiente urbano de qualidade.

No entanto, independentemente de quaisquer outros factores o que, em suma, parece ter falhado na concepção da obra e continua a falhar durante a sua execução, é a menorização da política de proximidade, que exige e impõe o chamamento dos munícipes a pronunciarem-se sobre os instrumentos de planeamento estratégico, que digam respeito às grandes decisões que envolvam as freguesias ou a cidade, os quais, pelo seu carácter estruturante, não podem deixar de ser alvo de profunda e participada reflexão pública.

Exemplo simples, mas vivo, do interesse e vantagem na realização deste diálogo, é o facto de o presidente da câmara ter anunciado o rebaixamento dos lancis do separador central colocado em frente ao posto da GNR, por forma a que, em situação de emergência, seja possível aos militares atravessarem para a via oposta com a maior rapidez possível; de facto, estando o projecto aprovado desde Dezembro de 2006, e estando os lancis colocados há três escassos meses, o que daqui se conclui é que só depois de um munícipe (Óscar DaMaya) ter chamado à atenção para este facto no período de intervenção do público duma reunião do executivo municipal é que esta anomalia foi reconhecida, havendo agora que alterar o que está feito, e que até agora os serviços técnicos da autarquia (dona da obra) não tinham detectado.

Assim sendo, para que pudessem concluir se o projecto da Nova Avenida da Cidade cumpre as expectativas que sobre si recaem, os ocupantes do ‘autocarro do amor’ haveriam que ter colocado, pelo menos, 7 (sete) questões essenciais ao senhor presidente da câmara, analisando de seguida, na sessão da asssembleia municipal realizada, as respostas a tais questões, que são as seguintes:

1 - Esta obra introduz alteração nas características da estrutura existente relativa ao comércio, serviços, equipamentos e habitação, convertendo-as num espaço urbano linear que contribua para uma regeneração urbana e uma valorização ambiental?

2 – Face à existência de uma zona desportiva municipal, estão proporcionadas condições de excelência que promovam a mobilidade sustentável, fomentando o uso de transportes não motorizados e a actividade física?

3 – A requalificação operada acompanha o reforço da importância das áreas culturais e de serviços existentes (Biblioteca Municipal e Paços do Concelho), em vias de conclusão (Casa da Cultura) ou em perspectiva (Palácio da Justiça)?

4 – A requalificação operada introduz incentivos à expansão do comércio, e privilegia uma interligação com a débil área social existente, designadamente com o interior da Avenida Abílio Pereira Pinto e com a estação ferroviária, tendo em conta o facto de combóio ser o transporte do futuro?

5 - Em consequência da obra a cidade fica dotada de um verdadeiro ‘coração social’ com abundantes espaços verdes, esplanadas e restaurantes, elementos de arte ou amenidades diversas, onde a par de uma utilização lúdica traduzida no encontro intergeracional, na conversação, na reunião, no devaneio ou na simples brincadeira infantil, seja também possível uma utilização artística, traduzida na realização de espectáculos ao ar livre?

6 – Tratando-se de uma intervenção de elevado custo e grandiosidade, por que razão é que a respectiva concepção ignorou aquela que é, talvez, a realidade objectiva do concelho com necessidade de maior atenção, e que tem a ver com o progressivo envelhecimento da população?

7 - Por que razão é que projecto da obra não teve em em conta a articulação de algumas ideias estruturantes consubstanciadas em intervenções que determinassem a criação de um centro funcional, cívico e social, que continua a não existir, dotando a cidade de Oliveira do Bairro de um verdadeiro ‘coração social’, intervenções essas que valorizassem o património histórico (do edificado à memória da cidade), que conferissem prioridade aos espaços públicos de identificação e de convívio (interiores e exteriores, funcionais e não funcionais), e que definissem e promovessem a personalidade da cidade consolidada (tornando-a atraente e promotora da coesão social, económica e urbana, da habitação ao trabalho e do lazer à religião, sem esquecer a centralidade do espaço da política)? 

É por isso que, mesmo reconhecendo-se a necessidade de uma intervenção de regeneração urbana na cidade, são sérias as reservas quanto ao tipo de intervenção que objectivamente resulta do projecto implementado.

Lamentavelmente, estas questões não foram colocadas naquela que foi a melhor oportunidade para o efeito.

E daí que o ‘autocarro do amor’ tenha circulado na alameda sem quaisquer sobressaltos: Era o autocarro do amor / Logo respondeu o revisor / Lá lá lá lá lá lá lá lá lá lá / Lá lá lá lá lá lá lá lá lá.