Hillary Clinton utilizou sempre, enquanto secretária de estado, de 2009 a 2013, uma conta pessoal de email, em vez da conta do estado.
Quem conta isto em pormenor é o "The New York Times", depois de ter confirmado e reconfirmado a notícia e de ter ouvido opiniões de várias pessoas. Ao contrário de nós, comuns mortais, ela não podia escolher não usar os canais oficiais, por uma questão de segurança informática mas também porque as comunicações de uma alta responsável, nos EUA, são preservadas para memória histórica.
Já se usou aquilo das tabuínhas, os papiros, os pergaminhos, o papel, cartas com selos, agora é um coisa mais etérea. Nas nuvens.
Talvez Hillary não estivesse consciente da obrigação. Já me aconteceu, apesar de não ser alta responsável de um país nem candidata a um cargo político. Como não disponho de uma equipa de conselheiros, fiz umas perguntas. Mais do que uma vez, muni-me de jornais para ler enquanto esperava que a minha senha fosse chamada. Não foram os melhores momentos da minha vida mas senti-me sempre muito acompanhada.
As salas de espera dos serviços oficiais e das lojas do cidadão são ajuntamentos de gente muito variada. Aprendi muito sobre doenças, histórias mais ou menos íntimas, coscuvilhices várias, porque nem todas as pessoas levam coisas para ler e têm de passar o tempo de alguma maneira. Conversas daquelas e depois ele disse e depois eu disse, rais partó miúdo, filho, olha que vais cair, já te tinha dito, zás. Nos últimos tempos as esperas foram substituídas por trocas de emails ou consultas com hora marcada, como nos médicos mas com mais respeito pelos horários. Estou muito agradecida.
Contas de email, era esta a história do início. Não sei o que me deu para fugir do assunto. Hillary diz que não fez por mal, ou melhor, os assessores dela dizem e ela está calada. Os calados são os piores mas há quem diga que o silêncio é de ouro. Talvez não quisesse abrir duas contas todos os dias para não perder contacto com família, amigos, faturas da eletricidade e do cartão de crédito. Ou não estivesse preparada para prescindir das ofertas de descontos para colchões viscoelásticos. Ou talvez a transparência que tanto defendeu em público não seja prioridade no que lhe diz respeito e prefira defender-se do seu próprio estado.
Talvez venha agora dizer que o assunto veio a lume porque as presidenciais se aproximam e até lá as suas contas vão ser vistas à lupa. E que ela e a família estão preparadas para ataques pessoais nos próximos tempos. Porém, a não ser que tenha um fascínio doentio pelos viscoelásticos, ao não utilizar a conta oficial de email violou uma regra do estado, e isso não é uma questão pessoal.
Ana Sousa Dias, aqui