sexta-feira, 7 de março de 2014

JUSTIÇA E BOM SENSO

Não pode haver 19 entidades autorizadas a fazer escutas e investigação criminal.


Há que reconhecer que a ministra da Justiça tem o mérito de ser reformista e de nortear a sua actividade política por regras lógicas e compreensíveis, mesmo que isso incomode certos grupos profissionais e de interesses.

Como foi referido nos últimos dias, Paula Teixeira da Cruz foi o primeiro membro do governo a cumprir com as imposições do Memorando da troika, que no caso da justiça até eram relativamente aceitáveis, embora difíceis de introduzir.

Um dos marcos dessa reforma passou pela controversa questão do anúncio do próximo fecho de significativo número de tribunais, o que, por um lado, se percebe, e não põe necessariamente em causa o acesso à justiça, mas, por outro, acentua a desertificação do Interior, além de somar casos em que os tribunais que ficam são exactamente aqueles que estão a necessitar de obras, desinvestindo-se de outros que foram construídos ou sofreram beneficiações recentemente.

Dir-se-á que do anúncio de um plano à sua execução vai um passo enorme e que o projecto sofreu ajustamentos diversos, além de que o PS já prometeu pôr tudo como dantes se ganhar as legislativas. É verdade. Mas mesmo assim a ministra avançou e fez coisas nesses e noutros domínios, aligeirando o processualismo e as manobras dilatórias em que a nossa justiça é fértil e com que favorece os mais ricos e capazes de contratar advogados, muitas vezes só para executarem essas manobras.

Por estes dias Teixeira da Cruz anunciou, por outro lado, que tenciona insistir nos julgamentos sumários de crimes graves, matéria que o Tribunal Constitucional chumbou nos termos em que estava prevista a medida, e na diminuição do número de órgãos de polícia criminal que podem fazer escutas, e que são nada mais nada menos que 19.

Quanto ao primeiro caso, a estratégia da ministra parece ser a voltar à carga garantindo duas coisas: que os julgamentos sumários sejam feitos por um tribunal colectivo, e não por um juiz individualmente, e que os arguidos possam sempre pedir que o processo se transforme em processo comum, ou seja, siga o curso normalmente previsto.

Quanto às escutas, a ideia é concentrá-las na Judiciária. Mesmo que isso implique um acréscimo de dificuldade para a corporação, que deveria ser reforçada para não perder eficácia na investigação, não se pode deixar de saudar a intenção.

Em Portugal, um cidadão poder ser escutado por 19 instituições de acordo com o que foi divulgado. A situação tem dentro de si dois absurdos inacreditáveis. Por um lado, a possibilidade de as escutas serem feitas por tantos organismos e, por outro, e talvez mais grave ainda, a circunstância de existirem 19 forças que têm poderes de investigação criminal, o que é grave e pode configurar um atentado aos direitos dos cidadãos.

Teixeira da Cruz quer pôr disciplina nas escutas e faz muito bem. Melhor ainda seria pôr ordem em todas essas espécie de polícias, cuja multiplicação sistemática constitui fatalmente uma ameaça à democracia.

Eduardo Oliveira Silva, aqui