quinta-feira, 6 de março de 2014

É VERDADE, PORTUGAL ESTÁ MESMO MELHOR

Num mundo cada vez maior, ou seja, onde cada vez mais gente entra no jogo da competição criativa e procura inovar, o mínimo que se pode dizer é que estamos presentes e bem em muitas frentes. Falta certamente a consciência disso.


Bem sei que a vida está mal e a política ainda pior. Bem sei que, a julgar pelas cabeças que nos governam, o país não tem futuro e o melhor é fugir daqui depressa. Mas, por outro lado, não podemos deixar de observar uma enorme capacidade de resistência criativa por parte de tanta gente. Novos e mais velhos.

Pode ser da Internet, mas nunca recebi tanto convite para exposições e eventos, tanta proposta inovadora, tanta notícia de sucessos pessoais e coletivos nas mais diversas áreas culturais, científicas e empresariais. Apesar da crise e da falta de dinheiro há muita gente que se agita, quer participar, ser alguém no mundo. 

Na frente literária temos tradição, agora reafirmada com novos autores de excelente qualidade. Esta semana, Manuel Jorge Marmelo recebeu o prémio do Festival Correntes d’Escritas. É do Norte e fala do norte. Mas de outra maneira. Deixou de lado os belos pedregulhos e trata a realidade como ela é, ou seja, normal, semelhante a tanta outra que existe por essa Europa fora, com tudo o que isso tem de trivial e de extraordinário. 

Nas artes plásticas o destaque vai para a incontornável Joana Vasconcelos agora com uma vasta exposição em Manchester. Detestada pelo meio artístico local, por ser demasiado kitsch e popular, cumpre perfeitamente o papel do artista que responde ao seu tempo. O zeitgeist, ou espírito do tempo, pode nem sempre ser do agrado da alta cultura, mas não deixa de constituir um elemento importante e descritivo de cada momento histórico. A pop arte, por exemplo, nunca foi outra coisa.

Também Vhils, o grafiteiro português que inventou um novo estilo, num ambiente bastante vulgar e repetitivo, anda pelo Brasil a mostrar a sua arte. 

E, já agora, fiquei satisfeito em saber da homenagem que recentemente fizeram ao Ângelo de Sousa, grande artista e amigo.

No cinema uma pequena empresa, a beActive, lança-se na ficção científica à séria. O filme "Collider" foi recentemente nomeado para os prémios Emmy e já tem garantida a circulação em vários países e plataformas. Representa uma nova e atualizada maneira de fazer e divulgar cinema. Abre caminhos.

O "ArchDaily", um dos sites de referência da arquitetura mundial, destaca vários projetos nacionais. Um deles, dos irmãos Luís e Tiago Rebelo de Andrade, venceu o prémio na categoria hotelaria. É uma "casa na árvore" extremamente interessante e atual, combinando a inovação formal com as, hoje dominantes, questões ambientais.

Ainda no Norte, no Porto, faz-se uma homenagem ao arquiteto Nuno Teotónio Pereira. Merecida. Além de bom arquiteto, inovador no tempo próprio, sempre foi uma excelente pessoa, o que também conta. E muito.

Na música, que conheço menos, e no teatro que me parece ainda muito agarrado ao passado, mesmo assim vão-se sucedendo as tentativas de renovação artística. Darão certamente melhores frutos no futuro.

Já no campo do design a produção nacional tem múltiplos picos de excelência. Sempre pensei que este é um domínio criativo muito apropriado ao ser português. Sóbrios, rigorosos, atentos ao detalhe e agora também inovadores nos materiais e aplicações, os nossos designers têm globalmente uma ótima qualidade. A associação ao mundo industrial e empresarial muito tem ajudado ao desenvolvimento desta área tão competitiva.

Na ciência poderia dar muitos exemplos. Destaco a Maria Mota, que recebeu recentemente o Prémio Pessoa e é financiada pela fundação de Bill Gates, pelo seu trabalho sobre a Malária, doença terrível que atinge as zonas mais pobres do globo.

Insisto, portanto. Apesar da crise e da pequenez do país, temos muita matéria de satisfação. Num mundo cada vez maior, ou seja, onde cada vez mais gente entra no jogo da competição criativa e procura inovar, o mínimo que se pode dizer é que estamos presentes e bem em muitas frentes. Falta certamente a consciência disso mesmo e sobretudo a compreensão do poder político para a importância desta realidade decisiva para o desenvolvimento. Mas mesmo isso vai ocorrendo por força da evidência.


Leonel Moura, aqui