Coincidindo com o conhecimento público da traição de François Hollande à sua companheira Valérie Trierwiler, o PS português anunciou o fim do seu 'devaneio' com o Presidente francês.
“Hollande sempre foi cinzento. Não se lhe conhece uma chispa”, sentenciou Manuel Alegre, que em tempos recentes tinha dito que ele poderia “criar uma nova dinâmica” na Europa.
“A esperança gorou-se”, admitiu José Junqueiro, com mais sinceridade.
E o líder parlamentar, Alberto Martins, renegou-o como referência, postulando: “As nossas únicas referências são os nossos valores”.
Hoje, na Europa, o Partido Socialista não encontra um único Governo de quem se sinta próximo.
Está 'orgulhosamente só' (usando uma frase utilizada em tempos pela esquerda para criticar o regime de Salazar).
Os socialistas portugueses estão sós, pois têm passado os últimos anos a correr atrás de miragens.
Viram a luz em Obama - mas ele desiludiu-os.
Celebraram a Primavera Árabe - mas esta deu naquilo que se sabe.
Apostaram no SPD alemão - mas ele rendeu-se a Merkel.
Acreditaram em Hollande - mas ele acabou por traí-los, enveredando pelas políticas que jurara recusar.
O PS ainda não percebeu que tem de pôr os pés na terra e deixar-se de ilusões, que invariavelmente acabam em desilusões.
No período mais quente do processo de ajustamento, os socialistas garantiam que o Governo não sabia negociar com a troika e que, se fosse o PS a fazê-lo, fá-lo-ia muito melhor.
Mas, quando foi recebido pela troika e apresentou as suas ideias, estas foram todas liminarmente rejeitadas.
Nem uma, para amostra, foi aceite.
Ora, se os credores não aceitam as sugestões do PS, se não há um único país na Europa que esteja a pôr em prática uma política em que o PS se reconheça, como quer o Partido Socialista convencer os portugueses de que tem uma alternativa viável?
Em que lugar da Terra podemos ver essa alternativa posta em prática, para ver se funciona?
Como é que os portugueses hão de acreditar que Portugal terá um destino glorioso com o PS à frente, se todos os exemplos que o PS foi apresentando se revelaram ilusórios?
O PS está hoje um bocadinho como o PCP: recusa a política vigente, protesta, barafusta, mas a única coisa que tem para oferecer é uma utopia em que ninguém acredita, a não ser os convertidos.
Para aspirar ao poder, o Partido Socialista teria de fazer um discurso credível.
Um discurso realista e não fantasista.
Um discurso de exigência e não de facilidade.
Um discurso de contenção orçamental e não de despesismo.
Ora, o PS faz exactamente o contrário.
Diz que quer menos impostos - mas, simultaneamente, defende mais dinheiro para a saúde, para a educação, para a ciência e para a cultura, mais subsídios de função, menos cortes nos salários e nas pensões, menos horas de trabalho, etc.
Quem pode acreditar num partido que diz isto?
Nos tempos de hoje, já não basta mandar umas bocas ou fazer comícios pelo país, como Mário Soares ou Manuel Alegre.
Esse tempo passou.
Há uma maior exigência por parte das instituições internacionais e dos mercados, e é preciso rigor - para não haver o risco de Portugal voltar a cair noutro buraco.
Com o aproximar das eleições, em que a tentação da maioria será abrir os cordões à bolsa, o PS deveria assumir-se como o partido da disciplina e denunciar tudo o que cheirasse a eleitoralismo.
Se o fizesse, credibilizava-se.
Mas, pelo que temos visto, fará exactamente o contrário: continuará a criticar a austeridade, que nos salvou da bancarrota, e a exigir mais despesa.
Continuará a prometer o impossível.
Assim, dificilmente conquistará o poder.
E, se o conseguir, tornar-se-á uma cruel desilusão - como aconteceu com Obama, Hollande ou o SPD alemão.
José António Saraiva, aqui