O Natal é um período arriscado: ou se acerta em cheio nas escolhas ou
falha-se miseravelmente.
Em inglês diz-se hit or miss, não há meio
termo nem purgatório. Para evitar erros grosseiros nesta época de festa andei à
procura de temas oportunos para escrever e deparei-me com a história de um tipo
que ofereceu à mulher um fazedor caseiro de neve - não confundir com uma muito
útil máquina de gelo.
Ele queria fazer história, deixar a sua marca idelével, e como vivia num país
de clima temperado uma máquina de neve pareceu-lhe o presente ideal para a
ocasião. Todos nós acalentamos algures no coração um sonho encantador e colorido
que anseia por ser concretizado. Ora, o tipo achou que a mulher iria adorar uma
máquina cuspidora de neve.
Havia certamente qualquer coisa de milagroso na
maquineta: não fazia chover, fazia nevar, o que é muito mais requintado e
moderninho.
No dia de Natal transportou a enorme caixa para dentro de casa, encostou-a ao
pinheiro importado e antecipou momentos de glória familiar e pessoal. Acontece
que as mulheres são intuitivas: sabem que as caixas de presente pequenas são
sempre bom sinal: joias, uma esplêndida caixa de trufas de chocolate, um
voucher para um Spa oriental. Caixas grandes são o oposto: transportam
grandes desilusões e arrelias que podem deixar marcas. Quando o marido abriu o
monstro e o pôs a funcionar inundou imediatamente a sala de neve química que
manchou não apenas o soalho impecável, mas também os sofás de pele genuína. Tudo
estragado. Não há outra maneira de o dizer: o general inverno instalou-se dentro
daquela casa.
O Natal é realmente um período arriscado para todos e para os políticos não é
exceção. É por isso que, por uma vez, devemos ter um módico de compreensão para
esta gente, os governantes e a oposição. Não espere ouvir nestes dias festivos
discursos que o façam levitar de otimismo, nem se deprima com a pobreza ou
ausência de sentido do que lhe tentarem dizer. Como explicou ontem Sua Majestade
a Rainha de Inglaterra na sua mensagem natalícia, com tantas distrações na vida
é fácil esquecermo-nos de fazer uma pausa para avaliarmos a situação. É preciso
reflexão, não apenas ação.
Um velho amigo brasileiro que já passou por tudo, recessões, perseguições e
ditaduras, agora que nos vê em Portugal muito aflitos, está sempre a dizer:
minha gente, é preciso deixar acontecer. Se tiver de pensar nalguma coisa, pense
nisso: deixe acontecer. Grandes caixas, grandes promessas, grandes declarações
solenes e contagens decrescentes (6,5,4,3...) acabam quase sempre em nódoas
difíceis de tirar. Isto, claro, sem pôr em causa a minha fé inabável no milagre
da lavagem a seco. Para o ano vou oferecer uma sensacional máquina dessas, já
que este ano a coisa não resultou exatamente como eu gostaria, mas isso é outra
história. Digamos que aprendi a lição, não é?
André Macedo, aqui