terça-feira, 26 de novembro de 2013

ERA UMA VEZ...

O AUTOMÓVEL CANSADO
Era um automóvel que trabalhava todos os dias

Acordava ou acordavam-no de manhã cedo e lá ia ele com o dono para o trabalho. 

Ainda se o dono trabalhasse o tempo todo num escritório, vá que vá. O automóvel, nesse caso, até podia descansar uns bons bocados, encostado ao passeio. 


Mas o dono era dos irrequietos. Passava o dia de um lado para o outro, pára, logo arranca, depressa que se faz tarde, num corrupio que fazia aflição. Há empregos assim, muito fatigantes, tanto para as pessoas como para os carros.

E aos fins-de-semana? Aos fins-de-semana, o dono do automóvel levava a família a passear. 
Em resumo, o carro nunca descansava. 

Um dia, cansado de tanto correr, protestou. 
- Este motor não anda bom - disse o dono. 

Protestou mais. 
- Este motor está a pedir uma grande revisão - disse o dono. 

De protesto em protesto, o automóvel resolveu fazer finca-pé. Parou, de vez. 
- Temos de chamar um reboque e mandá-lo para a oficina - disse o dono. 

Disse mais coisas, mas nós não contamos? Pudera. A meio do passeio de domingo, acontecer uma destas, quem é que não perde a paciência? 

Tão exasperado ficou o dono que resolveu trocar de carro. Apetecia-lhe um automóvel mais novo, mais potente, de um modelo mais moderno. 

O automóvel desta história foi arrecadado num armazém de automóveis velhos. 
- Daqui só para a sucata - disse-lhe uma carrinha muito desgastada pelos anos de serviço a um colégio. 

Agora tinha tempo para descansar. Descansou. 

Mas as prolongadas férias acabaram por pesar-lhe. 

Às vezes, aparecia alguém com vontade de comprar um carro barato, ainda em bom estado? Os automóveis alinhados aguardavam a decisão, com ansiedade. 
- Qual é o preço deste? - perguntou uma senhora ao vendedor. 
- Tanto - respondeu o vendedor. 
- Só dou tanto - disse a senhora. 

O comprador encolheu os ombros, em sinal de concordância. O automóvel desta história ganhava um novo dono, aliás dona, aliás Dona Henriqueta. 
- É só para dar de vez em quando uns passeios, visitar os filhos, os netos - explicou a senhora. - Nada de velocidades nem de grandes viagens. Este carrinho dá-me jeito. 

A Dona Henriqueta já está reformada. O automóvel ainda não. Teve sorte ou melhor, ambos tiveram sorte, porque o automóvel ainda dá muito boa conta do recado. 

Está ali para as curvas.

António Torrado e Cristina Malaquias, aqui