terça-feira, 19 de novembro de 2013

ERA UMA VEZ...


A FAMÍLIA DOS IS
- Ilda é o nome da minha tia. Ildefonso é o nome do meu tio, irmão do meu pai que se chama Inácio. Tenho um avô Isidro e uma avó Isaura. A minha mãe chama-se Irene e os pais da minha mãe, Ilídio e Isolina. Mas há mais: há a minha prima Inês, a tia Idalina, casada com o Doutor Isidoro, as minhas primas Isilda e Isabel e a minha irmã Ivone, que ainda é muito pequenina para saber o nome

Quem assim fala dos seus parentes, todos da ilustre família dos Is grandes, é o I ainda pequeno. 
- Chamo-me Ivo - diz ele. - Era para ser Hilário, calculem! Mas o meu avô Isidro, quando isto ouviu, segredou ao meu tio Isidoro e o meu tio Isidoro segredou à minha prima Isilda e a minha prima Isilda segredou ao meu tio Ildefonso e o meu tio Ildefonso deu um encontrão ao meu pai, que se preparava para escrever Hilário no livro do registo, e disse-lhe em voz alta: "Hilário é com H, homem!" O meu pai ficou muito corado e então escreveu por cima: "Ivo". E Ivo fiquei. 

Sou de Ílhavo, mas também podia ter nascido numa ilha qualquer ou em Itália, quem sabe? Ainda lá gostava de ir, um dia, de iate, claro. 

Hão-de estranhar que tenha nascido em Portugal, que não começa por I, mas não se esqueçam que está situado na Península Ibérica, pois então? 

Nunca me perco. E não julguem que sou ignorante. Antes pelo contrário, tenho muitas ideias e algumas fixas. Por exemplo: gostava, quando for grande, de ser ilusionista. Ivo, O Ilusionista imbatível, inimitável, incrível! Isto num grande cartaz iluminado. Claro que é tudo imaginação, faculdade de que não sou desprovido, podem crer. 

Devem talvez achar a minha conversa uma tontice da infância, uma ingenuidade, uma manifestação de inocência. Acham que falo caro, que falo importante? Talvez. 

Conheço como os meus dedos todas as palavras do dicionário começadas por I. De indicador espetado aprendi a ler todas elas. Perguntem-me o que é intempérie. Eu sei. O que é intelectual. Eu sei. O que é invólucro. Eu sei. Sou o sábio dos Is. Tanto assim que, quando em pequeno me perguntavam quais eram as vogais, eu recitava assim: I, A, E, O, U. Porque é que o A há-de ser o primeiro? 

Inteligente e instruído começam por I, tal como eu. 

E, por favor, não me chamem idiota!


António Torrado e Cristina Malaquias, aqui