terça-feira, 20 de agosto de 2013

EMIGRANTES E MAUS POLÍTICOS

O verão, o mês de agosto em especial, não é só o período nobre da "silly season", isto é, da multiplicação exponencial dos comportamentos asnáticos por metro quadrado

No pino do calor o país livra-se da injeção de angústia propagada em cada espaço noticioso da Comunicação Social, substituindo-a pela frivolidade do casa-descasa, e dos namoricos, e das festarolas do croquete de uma certa sociedade lisboeta (e "vendidos" a ela...) muito construída na base do verniz de quinta apanha.

Só uma outra marca, de muito maior substância, faz a diferença no Portugal de agosto: a do regresso dos emigrantes para matar saudades e dar vida a um Interior desertificado e ao qual, sem escapatória, continuam fixados os familiares carcomidos pelas saudades e pela velhice.

Houve um tempo no qual a fuga à guerra colonial e à miséria levou os portugueses à emigração. Os anos 60 e o início da década de 70 do século passado avolumaram a comunidade nacional espalhada pelo Mundo. Vítimas da impreparação, o garrafão de cinco litros e o presunto albergado no "bidonville" marcaram uma época. O esforço dessa gente de então gerou riqueza, integração nos países de acolhimento e, inclusive, inveja dos que por cá olhavam de soslaio o duvidoso gosto na construção de "maisons" e o ar anafado como, montados em carros de aluguer, surgiam nas romarias e nas festarolas de aldeia.

Hoje os tempos são outros.

A comunidade emigrante passou por uma fase de estabilização e a segunda geração foi-se, aos poucos, desligando dos lugares de origem dos familiares. Por cá, entretanto, o país preparou melhor a sua juventude, sobretudo através do acesso universal ao Ensino. Simplesmente, o processo tornou-se incompleto, a aposta na especulação financeira em vez do investimento no sistema produtivo só podia fazer colapsar a economia e o Portugal atual reincide em só permitir uma escapatória de futuro aos seus cidadãos: fazer as malas e partir. Agora mais bem preparados, para um mundo de horizonte mais aberto.

O estado desgraçado a que Portugal chegou inverteu o conceito vigente sobre os emigrantes. O verão português é marcado (ainda) pelo regresso às origens de milhares de emigrantes, mas já com outro estatuto. Reluzem nas estradas os carros-propriedade de matrícula francesa, alemã, suíça, luxemburguesa e por aí fora, e o matar de saudades faz-se mais a espaços. Cada vez mais dos velhos pais e avós, a caminho da extinção pela lei da vida; cada vez menos do pão com chouriço ou do folclore animador das verbenas.

Os governantes de Portugal, os passados e os atuais, não têm motivos para se orgulhar.

O sentimento geral da comunidade emigrante está longe de ser espelhado em todos quantos ainda visitam o rincão natal.

Os jovens e a meia-idade cujo destino de trabalho nos anos recentes apontou aos mercados da Europa, por exemplo, só querem cá voltar por curtíssimo tempo e enquanto tiverem os pais e os avós vivos... ou não os transferirem para os países de receção. 

Portugal para eles transformou-se no país do desconforto, da miséria, da falta de garantias de qualidade mínima de sobrevivência - e em contraponto à vida digna que levam. Esses são os emigrantes a justificar uma reflexão profunda. 

Recusam um Portugal vergonhoso, construído por uma classe política incompetente e incapaz de esconder a cara. 

Por vergonha. 

E decoro.

Fernando Santos, aqui