terça-feira, 21 de maio de 2013

O AMOR É CEGO

O país pode estar virado de pernas para o ar


Quase um milhão de desempregados; as pensões e ordenados reduzidos; a natalidade moribunda; leis de costumes cada vez mais apertadas; televisões que mostram uma nação deprimida.

Tudo isso pode acontecer, mas nada se compara à doença clubística. Na semana passada, uma parte significativa da população sofreu a bom sofrer com o jogo que, eventualmente, decidiu o título de campeão nacional de futebol português. 

Nos dias seguintes, ouvi e assisti a relatos verdadeiramente insólitos de pessoas que tinham todas as razões para estarem mais preocupadas com a sua situação laboral, pessoal ou de saúde. Mas nenhum desses problemas se aproxima da tristeza com que essas pessoas viveram os dias seguintes ao do suposto jogo do título.

O que levará então pessoas com outras pretensões e preocupações a encararem um jogo de futebol como a coisa mais importante da sua vida? Para mim torna-se difícil entender, até porque já estive do outro lado da barricada. Já sofri com as derrotas do meu clube e da Selecção Nacional, mas hoje vivo o lado bom do desporto: vibro com as vitórias e passam-me ao lado as derrotas.

O que levará então tanta gente a sofrer horrores com uma derrota do seu clube? Será pela irracionalidade desse sentimento? Deve ser, já que depois de passar a ressaca, alguns desses sentimentos voltam a registar níveis de confiança semelhantes aos anteriores aos desastres. Até ao jogo seguinte...

Voltando ao tempo em que era miúdo e não perdia um jogo ao vivo, recordo-me que das imagens que me ficaram para sempre na memória foram a dos adeptos do meu clube retirados do estádio por terem tido problemas cardíacos.

Nos últimos tempos lembrei-me dessas imagens, já que tenho alguns amigos que só não foram parar ao hospital porque tiveram o cuidado de tomarem alguns calmantes ou preferiram não ver o jogo.

Não é, pois, muito difícil de concluir que o amor clubístico tem uma força incompreensível para quem não o vive. E percebe-se também o sucesso dos programas desportivos que durante horas e horas debatem nas televisões e rádios se determinada jogada foi ou não penálti. 

É claro que toda a visão dos lances polémicos é determinada pela cor de quem está a analisar os lances. 

O amor é mesmo cego...

Vitor Rainho, aqui