Esta semana tivemos mais notícias do projecto de engenharia social em que nos
tornamos.
Já vamos em praticamente um milhão de desempregados registados e umas
largas dezenas de milhares que não arranjam coragem suficiente para ir ao centro
de emprego dar o nome. Mais de metade destes nossos concidadãos já não recebem o
subsídio de desemprego caminhando rapidamente para a miséria.
Gente que não era sequer pobre há dois ou três anos. Homens e mulheres de classe média, na sua maioria entre os trinta e cinco e os cinquenta anos, com filhos, com casas para pagar, cujas perspectivas de voltar a trabalhar são muito ténues. Pessoas que cedo ou tarde trabalharão por quase nada, se essa sorte tiverem, tal será o desespero.
Gente que não era sequer pobre há dois ou três anos. Homens e mulheres de classe média, na sua maioria entre os trinta e cinco e os cinquenta anos, com filhos, com casas para pagar, cujas perspectivas de voltar a trabalhar são muito ténues. Pessoas que cedo ou tarde trabalharão por quase nada, se essa sorte tiverem, tal será o desespero.
Tudo gente a quem foi dito que se devem ajustar a um novo modelo
social. Um que não tem contemplações com quem não for empreendedor, com quem não
for especializado em indústrias transaccionáveis; aquele que não suporta piegas.
Também ficamos a saber que quarenta por cento dos nossos rapazes e raparigas
não conseguem começar as suas vidas profissionais. A mais bem qualificada
geração portuguesa está condenada a emigrar. São, no fundo, uns privilegiados.
Estes ainda podem zarpar para outros lugares. Como os seus avós, fogem à fome e
como os seus avós partem não porque querem mas porque não há lugar para eles.
Ficam os velhos, os que não podem fugir.
Números, muitos números que o primeiro-ministro promete rever. Para já temos
uma economia em recessão profunda, sem investimento, sem procura interna, com as
exportações a diminuir e dentro em pouco com menos 4 mil milhões de euros a
circular: ninguém percebe como raio não vão ser destruídos ainda muitos mais
empregos que o previsto ou que milagre se dará para que a economia comece a
crescer. As boas notícias são que lá para o segundo semestre o ritmo da subida
do desemprego vai diminuir, ou seja, vamo-nos afundando mais devagarinho. Nessa
altura o primeiro-ministro volta a rever a folha de cálculo.
Os valores do desemprego correspondem a uma vontade política. Não da
responsabilidade integral do Governo, que fique claro. Mas que o Governo abraçou
de forma entusiástica as políticas que conduzem à recessão e ao desemprego, não
há dúvidas.
Todas as medidas que foram sendo tomadas e que vão continuar a ser terão
sempre este tipo de consequências. No fundo, o Governo acredita que destruindo o
actual tecido económico, provocando a maior recessão da nossa história recente,
atirando milhões para o desemprego, dum momento para o outro e duma forma
radical, resultará num país novo, dinâmico, exportador, empreendedor. Sem
preguiçosos e sem os mandriões que viviam à custa dos subsídios de desemprego e
dos rendimentos de inserção.
Não é só uma revolução económica que está em marcha, é sobretudo uma
revolução social. O Governo e os loucos europeus apostaram na revolução, no mais
puro radicalismo ideológico. Resolveram testar meia dúzia de princípios
ideológicos colados com cuspo e decidiram tornar uma geração praticamente
inteira num exército de inúteis, de gente dispensável, de pessoas que não
encaixam, que viverão à margem.
Só que uma comunidade não subsiste, não coopera, não prospera, dividindo os
seus cidadãos em obsoletos e modernos, em velhos e novos, em úteis e inúteis, em
funcionários privados e públicos, em empreendedores e não empreendedores. Quando
destruímos a solidariedade entre os cidadãos, quando deixamos de ter objectivos
comuns deixamos de ter uma comunidade no verdadeiro sentido da palavra. Uma
sociedade onde um em cada quatro cidadãos não tem emprego (por enquanto), com
pessoas que dentro em pouco não conseguirão subsistir por si próprias, em que as
outras em grande parte viverão no limiar da pobreza, que expulsa do País uma
geração, não é uma verdadeira comunidade.
Num país com um exército de desempregados, minado pela pobreza, com as
prestações sociais muito diminuídas, a democracia será apenas um detalhe sem
importância. Pouco tempo sobreviverá.
Quanto tempo ainda teremos? De quanto tempo mais precisará a Europa para
perceber que está a destruir um país? De quanto tempo mais precisará Passos
Coelho para entender que tem de inverter o rumo? Nós já temos pouco, muito pouco
tempo.
Pedro Marques Lopes, aqui