Vou falar das multas para quem não pede faturas nas lojas ou nos
restaurantes.
Queixava-se no outro dia o antigo vice-presidente dos Estados Unidos, Al
Gore, da rejeição de uma proposta que pretendia obrigar as transações
financeiras em mercado bolsista durarem, no mínimo, um segundo. Em nome, entre
outras coisas, da preservação da liberdade, a ideia caiu.
Para quem não sabe, eu explico: algoritmos geridos em computador otimizam em instantes de milissegundos compras e vendas de ações, à procura de pequeníssimas margens de lucro que, no entanto, multiplicadas milhões de vezes, somam fortunas colossais.
Para quem não sabe, eu explico: algoritmos geridos em computador otimizam em instantes de milissegundos compras e vendas de ações, à procura de pequeníssimas margens de lucro que, no entanto, multiplicadas milhões de vezes, somam fortunas colossais.
Isto significa que uma empresa ou um sector de atividade podem, literalmente,
num piscar de olhos, entrar em colapso sem motivo.
Para acontecer um desses terramotos basta, por exemplo, uma pequena flutuação
de ações ocorrida num determinado milissegundo, em qualquer mercado bolsista do
mundo, levar um desses algoritmos a reagir automaticamente e a processar uma
série maciça de ordens de compra ou de venda.
De repente, o que era saudável fica doente, dá-se o alarme e todos os
possuidores de ações correlacionadas entram em frenesim. Segue-se, inevitável, o
pânico...
O que tem isto a ver com multas aos consumidores por não pedirem faturas nas
lojas? Tem tudo.
A maior corretora de Wall Street tem servidores Linux - o sistema operativo
livre que, ironicamente, já foi acusado de inspirar a ideia de uma economia
comunista - a gerir um milhão e meio de empresas cotadas e a processar 250 mil
ordens de compra e venda por segundo. As transações são confirmadas a cada dois
milésimos de segundo. Imaginem a perda para a corretora se este ritmo passasse a
ser, "apenas", de um segundo para cada transação confirmada.
A liberdade de vender e comprar à velocidade da luz tem, portanto, um preço
elevado, é muito mais cotada para estes liberais que governam o planeta do que a
liberdade de alguém pagar o seu café sem que o Estado fique a saber disso. Uma é
inviolável, a outra depende.
Esta história repete-se: o mesmo poder político que, em nome da defesa da
liberdade, recusou em Portugal que todas as declarações de impostos fossem
públicas - revelando a forma como as pessoas ganham dinheiro - acha admissível
ter fiscais espalhados pelo País a bisbilhotar como cada um gasta esse dinheiro,
isso sim, uma vigilância a atirar para o fascista.
Para ganhar dinheiro, podemos ser livres. Para o gastar, podemos ser
vigiados. Conclusão: para esta gente, a liberdade, hipócrita, é um mero
instrumento de gestão.
Pedro Tadeu, aqui