sábado, 2 de fevereiro de 2013

EXPLICAR O "BÊ-Á-BÁ"


António José Seguro disse no fim-de-semana, pela centésima trigésima oitava vez, que é preciso relançar a economia.

E está cheio de razão.
Nenhum sacrifício terá valido a pena se a economia não voltar a crescer.
Como poderemos então concretizar este objectivo?

Tenho ouvido dezenas de comentadores e políticos-comentadores falar nas televisões sobre o ‘relançamento da economia’, e fico sempre com a impressão de que muitos deles não fazem a mínima ideia do que estão a dizer.
Debitam palavras.

É isso que me leva a escrever este artigo.

O incremento da economia faz-se através do investimento, e basicamente há três tipos de investimento: o investimento público, o investimento privado nacional e o investimento estrangeiro.
O investimento público foi aquele em que apostou forte um homem chamado José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
Sócrates lançou grandes projectos como o TGV ou o novo aeroporto de Lisboa.
Mandou construir auto-estradas de utilidade duvidosa.
Incentivou pessoalmente negócios como o Magalhães, os automóveis eléctricos ou as energias renováveis, não tendo problemas – honra lhe seja – em vestir a pele do vendedor para promover estes produtos.
Foi à Venezuela ao encontro de Chávez, foi à Líbia ao encontro de Kadhafi, e convidou ambos a visitar Portugal, sempre com o mesmo objectivo: conseguir mercados e compradores para os produtos nacionais.
Visitou centenas de empresas, deixando palavras de optimismo.
E este esforço foi apoiado por um marketing agressivo, que deu enorme eco a todas as iniciativas, no sentido de galvanizar os portugueses e afastar do horizonte qualquer ideia de crise.

Ora, qual foi o resultado final desta política?
A economia cresceu muito pouco e a dívida pública e a dívida externa cresceram em flecha.
Assim, sem querer, Sócrates mostrou que a tentativa de fazer crescer a economia através do voluntarismo e do investimento público não resulta.
A dívida cresce muito e a economia cresce muito pouco.
Para incentivar a economia restam, pois, dois caminhos: o investimento privado nacional e o investimento estrangeiro.

No que respeita ao investimento nacional, está muito condicionado pela situação difícil das empresas e pela má situação dos bancos.
Como os bancos têm dificuldade em capitalizar-se, não dispõem de margem para financiar as empresas – e estas ficam sem possibilidades de investir.
É um ciclo vicioso.
Para a situação neste aspecto se normalizar, é preciso que Portugal recupere a confiança dos mercados – de modo a que a banca volte a financiar-se directamente lá fora em boas condições e possa apoiar as pequenas e médias empresas.

E o mesmo vale para as grandes empresas.
Quanto ao investimento estrangeiro, o caso coloca-se aproximadamente do mesmo modo.
Para que os investidores externos apostem em Portugal, é preciso que o país recupere a sua imagem no exterior.
E essa recuperação passa pela estabilidade política e pelo cumprimento dos compromissos que o país assumiu.
‘Credibilidade externa’ é pois a expressão-chave, que vale para o investimento estrangeiro, para o financiamento dos bancos e das empresas, e para o próprio financiamento do Estado.

Ora, pela evolução dos juros da dívida, verificamos que o país perdeu a credibilidade com a política seguida até 2011 (obrigando ao pedido de resgate por parte de Sócrates), e começou a recuperá-la com a política de austeridade seguida de então para cá.
A austeridade foi, portanto, decisiva para recuperar a confiança externa – recuperação esta sem a qual seria agora impossível o relançamento da economia.
Dito de outro modo, sem ter havido austeridade não haveria perspectivas de crescimento económico.
Este caminho tinha de ser feito.

Depois do regresso aos mercados, que esta semana se iniciou timidamente, mas com sucesso, aliado às reformas realizadas na legislação laboral (e noutros sectores como a Justiça), haverá teoricamente condições para o investimento começar a crescer.
Mas isso, note-se, não depende do Estado nem do Governo – depende dos investidores nacionais e internacionais.
E atenção: mesmo que as melhores expectativas se confirmem, não podemos dizer abruptamente adeus à austeridade e voltar ao passado.

Portugal é como um doente que teve uma pneumonia, e que não pode de um ia para o outro começar a fazer uma vida normal – andando na rua, apanhando chuva e frio, etc.
O organismo tem de se adaptar progressivamente à normalidade.
Aquilo que o país alcançou através de um caminho difícil e trabalhoso não pode vir a ser prejudicado por actos precipitados e imprudentes.

Tendo em conta o que passámos (e ainda estamos a passar), não nos podemos deixar tentar outra vez por aqueles que, quais diabinhos, nos piscam o olho e prometem facilidades.

À primeira cai qualquer, à segunda cai quem quer.

José António Saraiva, aqui