Quando ontem 18 deputados do PSD anunciaram uma declaração de voto a
vergastar o aumento de impostos e a estagnação da economia para acompanhar,
contraditoriamente, o seu voto favorável à proposta do Governo para o Orçamento
do Estado, assistimos a algo mais do que um episódio caricato.
Mesmo depois de aquela posição crítica ter sido embrulhada num texto mais
ameno, subscrito no final por toda a bancada social-democrata, restou a
ilustração radical de como as consciências estão a pesar nos 108 cérebros que,
no hemiciclo de São Bento, têm de garantir a perenidade de Passos Coelho na
chefia do Governo.
Esta gente, há um ano, exultou, achou mesmo inevitável e patriótico submeter o país a doses irracionais de austeridade, a cortes de subsídios, a aumentos de impostos. Essas medidas eram "uma inevitabilidade" quando atingiam apenas os funcionários públicos, os pensionistas, os reformados, os pequenos empresários, os que trabalham por conta de outrem a troco de salários medianos.
Esta gente, há um ano, exultou, achou mesmo inevitável e patriótico submeter o país a doses irracionais de austeridade, a cortes de subsídios, a aumentos de impostos. Essas medidas eram "uma inevitabilidade" quando atingiam apenas os funcionários públicos, os pensionistas, os reformados, os pequenos empresários, os que trabalham por conta de outrem a troco de salários medianos.
Agora, por força do falhanço do plano da troika, o aumento brutal do mesmo
remédio fiscal daí resultante adoenta estes senhores.
Porquê? Porque até os amigos destes deputados do PSD vão pagar: os
companheiros, os apoios políticos, os empresários do sistema, os seus advogados,
até a família. Lê-se-lhes na cara: "Não foi para isto que chegámos aqui!..."
Ainda corremos o risco de os vermos, lenço palestiniano na cara, a atirar pedras
ao Parlamento.
Até poderia o Governo argumentar que está finalmente atingida a tão reclamada
equidade de sacrifícios - o que infelizmente não é verdade -, mas também não é
assim que os convencem. Agora, que lhes dói, acham também que a economia não
aguenta tamanha sangria. Agora, que lhes vão ao bolso, não acham bem.
Esta indignação tardia pode sofrer, portanto, de uma boa dose de hipocrisia,
mas não é inconsequente. Este rombo no seio ideológico do Governo, que teve um
prelúdio nos figurantes do Partido Popular e num enorme rol de comentadores do
regime, vai resultar, mais tarde ou mais cedo, em actos políticos sérios.
Significa isto que, a prazo, as medidas que têm sido aplicadas acabarão por
ser abandonadas? Não.
Significa, como tantas vezes o passado nos ensinou, que se
nada de mais substancial se alterar estas políticas, no essencial, perdurarão.
As vítimas é que voltarão a ser, exclusivamente, as do costume: os cidadãos que
nada têm a ver com os interesses, as relações e as dependências dos que, no
círculo do poder, momentaneamente, foram apanhados de surpresa.
Pedro Tadeu, aqui