terça-feira, 23 de outubro de 2012

ERA UMA VEZ...


SÓ UM DIA
Só Um Dia
O dia nasceu enfarruscado. A pesada manta de nuvens cobria o céu todo, sem deixar de fora sequer uma nesga de azul. Devia ser do frio


As pessoas iam à sua vida, encafuadas nos seus pensamentos, sem a sombra a acompanhá-las. Faltava a luz do Sol. 
- Que dia tão feio - disse alguém. 



O dia, que poucas horas tinha de vida, amuou e fez beicinho. Choramingou. Choveu. 
- Já cá falta a chuva? - disse mais alguém, chapinhando na lama. - Que dia horrível. 


O dia sentiu-se e, ofendido, mais carrancudo se pôs. E protestou, em forma de trovoada. 

Trovejou e choveu que tempos. Depois de muito ter barafustado, o dia cansou-se. 

Pararam chuva e trovões. Foi um alívio. Ficou o ar lavado e a terra encharcada e contente.  - Há dias piores - disse alguém. 

Não era um elogio, mas para aquele dia, que ainda não ouvira uma palavra amável, soou a elogio. Com um suspiro reconfortado, deixou que uma brisa desvanecesse as nuvens. 


Começaram a desenhar-se as sombras atrás das pessoas. 
- Ainda vamos ter um lindo dia? - disse alguém. 

O dia abriu-se num sorriso que rasgou o céu de par em par, muito azul, muito luminoso. 




Brilharam as ervas e as folhas ainda molhadas. 
- Que dia maravilhoso - diziam as pessoas umas para as outras. 


O dia também era da mesma opinião. Mas de si para si comentou: ?Como as pessoas são inconstantes. Ora dizem uma coisa ora dizem outra. Não as entendo". 



Pois era. Para entender as pessoas um dia não bastava?

António Torrado e Cristina Malaquias, aqui