sábado, 8 de setembro de 2012

A MÁSCARA CAÍU


Nos exames trimestrais, já se tornou habitual cedermos a iniciativa política

 Deixarmos até que a língua portuguesa seja trocada pelo inglês sem tradução - mesmo nos documentos oficiais. É a vida. Jogamos fora cá dentro: encolhemos os ombros, engolimos as medidas, curvamos a espinha. 

Na verdade, é tudo simbólico: lavamos as mãos do nosso próprio destino. Eles mandam, nós cumprimos.

O que acha a troika desta boa vontade? Ora bem, se Relvas é o ministro das equivalências e Borges o equivalente a ministro, então a troika, mais coisa menos coisa, equivale ao nosso Governo. Tudo normal, portanto. Será mesmo assim? Esta semana, num encontro com um grupo de sindicalistas, a troika sublinhou que afinal a responsabilidade das medidas é do Executivo português, não dela. O bom, o mau e o péssimo do memorando de entendimento deve ser atribuído só ao Governo. É ele que executa e presta contas.

Naturalmente, a frase caiu mal. Soou a traição, embora na realidade, contra todas as indignações, tenha calhado muito bem. Devíamos ter festejado o acontecimento. Aquela frase é uma boa frase. Aquela frase dá-nos algum espaço de manobra, responsabiliza-nos e abre um debate que até agora parecia chutado para as margens da espuma partidária.

A este gesto que a troika fez sem querer, sem pensar e talvez sem medir as consequências podemos chamar de nation building - a expressão que as Nações Unidas usam para dar algum poder aos países ajoelhados. Significa capacitar os nativos que eles têm de começar a andar pelo próprio pé. Não vale a pena culpar os outros, embora isso faça parte do processo de cura: negação, raiva (histeria), negociação, depressão, aceitação. Já passámos pelas primeiras quatro fases, embora com a ordem trocada e sem nunca aprofundar o terceiro passo - a negociação.

É essa possibilidade que agora se reabre diante de nós. Não passámos a ter avenidas floridas à nossa frente, a margem continua estreita, as metas impossíveis, a Zona Euro uma bomba relógio. Mas caiu por terra o imperativo moral (moralista) do Governo - verguem-se, ó culpados - que se abatia sobre os portugueses. O memorando deixou de ser o tapume teórico e a escritura que justificava todas as medidas e agruras. 

Perdida em parte a desculpa, não resta ao Governo senão assumir a ideologia em nome próprio, com virtudes e defeitos, embora no contexto económico atual. O que equivale a dizer: resta a Passos Coelho governar além da troika, não para a troika - para o País. 

Caiu finalmente a máscara. Pode até ser bom. 

Pode moderar os piores instintos.

André Macedo, aqui