sábado, 14 de julho de 2012

A BANDALHEIRA DAS ELITES

Peço desculpa por vos maçar com um naco da minha vida pessoal.

Só o faço por achá-lo interessante em termos de história comparada no quadro da ideia que formei sobre as formidáveis telenovelas dos cursos de Sócrates e Relvas serem, afinal, a expressão mais mediática da bandalheira que o negócio do ensino está a produzir, atingindo as próprias elites.
Fui dos primeiros portugueses a licenciarem-se em jornalismo. O meu curso, designado de Jornalismo e Comunicação Social, durou quatro anos, na Universidade Livre de Bruxelas, que, sendo de influência maçónica, nunca me usou para rede de difusão do credo. Beneficiei de uma bolsa e trabalhei [de trinca-bilhetes no metro a operário na fábrica de gelados Artic, passando por animador cultural de uma associação de marroquinos] para pagar esses quatro anos de universidade que me proporcionaram a licenciatura.
De regresso a Portugal - de onde partira para não ser preso pela PIDE, embora não fosse comunista - obtive trabalho e emprego à conta de jovem promessa, mas por pouco tempo: uns simples cravos num 25 de Abril de que fui cúmplice distribuidor na Redação de "O Primeiro de Janeiro" bastaram para colocar todas as dúvidas, uma vez que o grande jornal liberal do Porto estava nas mãos do CDS de então, que haveria de coligar-se com o PSD e os monárquicos na Aliança Democrática.

Passei a perigoso comunista, o que me motivou finalmente a experimentar a militância. Por poucos anos, mas os suficientes para entender o que a universidade não me ensinara: os ideais são sempre abandonados quando se perfilam as razões práticas. Concluí, portanto, que o melhor seria substituí-los à partida pela simples ética republicana: a lei. Coisa que me acompanha com a persistência das religiões.
Bem, depois, lá me safei. E aqui estou, para vos servir. Com gosto.
Contei-vos isto porque acho que Relvas, como Sócrates, apenas merecem ser avaliados pelos seus atos políticos, pois os canudos, tal como a mim, em pouco lhes devem ter servido para a função real. E também porque conheço demasiadas histórias, algumas delas relatadas nestas páginas, que mostram que foram algumas universidades, que, na gula do negócio, depois de terem nascido às costas do Estado e nas costas do ensino público, aproveitaram alguns mecanismos - uns europeus, como o de Bolonha, outros nacionais, como os das composições amiguistas dos conselhos diretivos, científicos e pedagógicos - para abandalharem a atribuição de títulos científicos.
Tal qual a conhecemos, a vida em democracia social, económica e política exige da sociedade [e do Estado] que produza elites. Não para que essas elites se transformem em castas sociais superiores - o ensino público tem a obrigação de impedir essa tentação - mas, sim, para serem referências de credibilidade.

Retirada daqui