terça-feira, 31 de janeiro de 2012

ACORDAR OS MONSTROS DESBRAGADAMENTE...

A história da decadência da União Europeia entrou num novo estádio e a mais desbragada humilhação está em curso.

É agora oficial: a Alemanha defende que o orçamento grego seja gerido por um funcionário nomeado pela Comissão Europeia que terá plenos poderes sobre o governo local.

O número dois do governo alemão foi ontem muito claro sobre a necessidade de instalar um funcionário europeu em Atenas para governar o país, uma vez que os objectivos da troika não foram atingidos pelos governos Papandreou-Papademos.

Mas quem diz a Grécia, diz Portugal. Segundo a Reuters, o projecto alemão defendeu o controlo do orçamento de qualquer país sob assistência financeira que esteja a falhar os objectivos do programa da troika.

A soberania já tinha sido hipotecada a troco do empréstimo externo. Agora a Alemanha espera que lhe seja oferecida de boa-vontade – como se houvesse uma espécie de quinta coluna em todos os países europeus prontos a facilitar a ocupação alemã sem resistência. Tendo em conta que os objectivos do nosso programa da troika são de muito difícil cumprimento, a possibilidade de um funcionário europeu se instalar no lugar de Vítor Gaspar tornou-se, aos olhos do governo alemão, espantosamente credível.

O que é espantoso é a naturalidade com que a Alemanha – a quem a Europa perdoou a dívida da Segunda Guerra – acorda agora todos os monstros possíveis sem tremer. Ontem, a resposta do ministro grego das Finanças, Evangelos Venizelos, foi uma amostra do que poderá começar a ocorrer em larga escala. “Quem põe um povo perante o dilema de escolher entre a assistência económica e a dignidade nacional está a esquecer algumas lições básicas da História”, disse Venizelos, que nasceu 12 anos depois do fim da Segunda Guerra, quando a Grécia esteve sob ocupação da Alemanha nazi.

A degenerescência europeia atingiu o seu ponto de não retorno. Atravessou-se uma espécie de Rubicão para a ideia de Europa unida: a ideia original da União Europeia capotou e a partir daqui tudo é possível. Nos próximos tempos a Grécia vai evidentemente falir e, em consequência, o euro vai rebentar despedaçando em estilhaços uma economia durante tantos anos muito forte.

A ideia peregrina que corre em Bruxelas de que o euro sobrevive à saída da Grécia é piedosa. Não é preciso ser um grande economista para perceber que o euro contaminado não sobrevive à saída da Grécia – e, infelizmente, Portugal será o primeiro alvo na carreira de tiro.

Ana Sá Lopes, aqui