quarta-feira, 10 de agosto de 2011

CARTA A UM LADRÃO DE MALAS NO AEROPORTO

Marian, romeno, tem uma longa carreira no mundo do furto e foi apanhado a roubar malas no aeroporto.

Como não apareceu no dia do julgamento, informamo-lo em primeira mão, via carta, de tudo o que aconteceu no tribunal.

Marian, esta carta é para si. O que é que lhe passou pela cabeça? Você até nem é novato nestas andanças, como é que se meteu numa assim? Assaltar uma loja no aeroporto de Lisboa, onde existem câmaras de videovigilância de dois em dois metros? E para roubar uma mala de viagem? Uma coisa é certa, Marian, pode começar a pensar numa carreira no mundo da moda: a polícia tem tantas fotos e imagens suas - de todos os ângulos possíveis e imaginários - que dão para fazer um book. É questão de ir lá pedi-las e depois contactar uma agência de modelos.

Marian, há coisas que não se fazem. Depois de ter sido detido e conduzido aos calabouços do tribunal para primeiro interrogatório, até teve uma sorte dos diabos, já reparou? A advogada de defesa oficiosa que estava de escala compadeceu-se de si e conseguiu adiar o julgamento para ter tempo para lhe preparar uma defesa condigna. Foi à pala disso que você pôde regressar a casa nesse dia, notificado da data em que se devia voltar a apresentar no tribunal para ser julgado.

E o que é que você faz? Não aparece. Nunca mais dá sinais de vida e deixa a sua própria advogada de defesa pendurada no dia do julgamento. A sua advogada e o seu conterrâneo, o intérprete romeno que o tribunal mandou chamar, também para o ajudar. Não se faz, Marian. É pior que deixar uma gaja pendurada no primeiro encontro.

Provavelmente, Marian, ainda não foi notificado do que lhe irá acontecer num futuro próximo. Serve, então, esta carta para lhe contar tudo o que aconteceu, na sua ausência, no tribunal. Você foi mesmo julgado e a coisa está preta aí para os seus lados.

O agente Sá Pinto, da polícia, contou à juíza como tudo aconteceu. Ele é aquele polícia que o apanhou, recorda--se? Trabalha na área das partidas, no aeroporto. O tribunal já sabe de toda a verdade: sabe, por exemplo, que você não actuou sozinho. Quando o seu camarada roubou a primeira mala daquela loja no aeroporto, os funcionários contactaram logo a polícia. E o tal agente sentou-se, à paisana, num banco em frente à loja. Passada uma hora, sai você, com mais uma mala roubada lá de dentro. Como é que o PSP suspeitou? O homem contou que a mala que você carregava era "gigante", não tinha qualquer etiqueta de viagem e a sua expressão corporal e a maneira como a manuseava denotavam que a mala estaria vazia. Pois é, Marian, o Sá Pinto seguiu-o sem você dar conta e depois... bem... depois você já sabe o que aconteceu: foi detido, veio uma das empregadas da loja confirmar que aquela mala tinha sido furtada e que custava 238 euros e você foi parar aos calabouços da polícia.

Os seus amigos foram mais espertos, Marian. Mas diga-lhes lá que eles também aparecem nas filmagens da loja. As imagens são detalhadíssimas: mostram-nos a cortar os cabos do alarme de várias malas (uma delas foi lá você buscá-la depois, não foi?). E mostram também uma cena ternurenta: depois de cortarem os alarmes, foram passear-se para uma zona da loja onde só há peluches expostos - como se andassem à procura de um teddy bear para oferecer. Por fim, as filmagens mostram-nos a sair sem comprar nem roubar nada.

Ah! O tribunal também ficou a conhecer, em detalhe, toda a sua actividade "profissional" nos últimos anos em Portugal. O agente da PSP consultou os ficheiros da polícia e disse que você "correu o país de norte a sul a fazer furtos em centros comerciais, desde 2009, de Bragança a Faro". Já a juíza só falou das últimas actualizações ao seu curriculum vitae, perdão, registo criminal. Veja lá se se recorda: 3 de Dezembro de 2010: condenado por furto, 60 dias de multa; 3 de Fevereiro de 2011, condenado por furto, 70 dias de multa; 24 de Maio de 2011, condenado por furto, 80 dias de multa. Se o meu querido Marian achava que desta vez, até por uma questão matemática, seria condenado a 90 dias de multa, está enganado.

A juíza condenou-o a seis meses de cadeia, mas substituiu-lhe a pena pelos mesmos dias em multa, a uma taxa diária de seis euros. E porque não quero que lhe falte nada, fiz as continhas e tudo: 1080 euros de multa.

Agora, Marian, vai ter de "trabalhar" muito para conseguir pagar ao tribunal.

Atenciosamente.

Rosa Ramos, aqui