segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

PAIXÃO: O CUPIDO ATINGE NUMA FRACÇÃO DE SEGUNDO E UM BEIJO SABE A COCAÍNA

A paixão é física, química e intelectual. E até já há um teste para medir compatibilidades.

Uma mulher pode ter um orgasmo só com um beijo? Francisco Allen Gomes, psiquiatra e um dos maiores especialistas portugueses em sexologia, ri da pergunta. "Conheci uma mulher que a primeira vez que teve um orgasmo foi quando viu uma nota numa pauta." A resposta mostra que ainda nada é definitivo na busca científica pela química da paixão e do amor.

A garantia de que o beijo pode substituir assim o acto sexual, para além de permitir avaliar "compatibilidades genéticas" e de ter um efeito semelhante no cérebro a uma dose de cocaína, é da bióloga norte-americana Sheril Kirshenbaum e surge no novo livro "The Science of Kissing." A tese não é nova, já que nos últimos anos vários investigadores têm demonstrado que a paixão resulta de um cocktail de químicos semelhantes aos libertados pelo consumo de droga, que actuam nas zonas de gratificação do cérebro.

Helen Fisher, especialista em biologia antropológica da Universidade Rutgers, New Jersey, tem sido uma autora prolífica. Allen Gomes sublinha que, apesar de uma comparação directa entre um beijo e uma dose de cocaína poder ser excessiva, Fisher demonstrou existir uma grande proximidade entre as zonas do cérebro atingidas por uma e outra. "Tem que ver sobretudo com a dopamina e parece ser esta a base para o amor ser uma motivação natural", diz o psiquiatra. "Mas se analisarmos, o ódio também acontece perto do amor e a felicidade perto da raiva."

Kirshenbaum, citada este fim-de-semana pelo jornal espanhol "El País", explicava que o facto de a dopamina disparar durante um beijo apaixonado, como acontece no consumo de cocaína, pode explicar os "pensamentos obsessivos associados a um novo romance". "Faz-nos querer mais e sentimo-nos carregados de energia. Sob o seu efeito, perdemos o apetite, temos dificuldade em dormir e de-senvolvemos comportamentos erráticos." Allen Gomes ajuda a diagnosticar: "Como lhe chamou Fisher, a paixão é uma dependência agradável se for correspondida e privativa se houver rejeição."

Dopamina, ocitocina, adrenalina e serotonina são algumas das substâncias produzidas pelos neurónios já associadas à paixão. Com base em níveis acima da média quando se está apaixonado, muitos tentaram já impor um prazo de validade ao encantamento: seis meses a dois anos. Num artigo publicado recentemente na revista "Bipolar", Allen Gomes rejeita a limitação: "Casais com ligações de mais de 20 anos e que se declaram ainda apaixonados mostram activações cerebrais semelhantes aos casais a viverem os primeiros estádios da paixão. Quer dizer que a paixão não tem de ser necessariamente breve. Breve será, por definição, o turbilhão emocional que a acompanha." Kirshenbaum pede mais investigação nesta área: o grosso das cobaias têm sido "jovens universitários em pleno despertar sexual", disse ao "El País".

No final do ano passado, um estudo publicado por Stephanie Ortigue, da Universidade Syracuse, revelou que a activação destes circuitos numa situação de paixão demora um quinto de segundo. Segundo a investigadora, além da resposta eufórica, a paixão também incide sobre áreas intelectuais, por exemplo as que processam a imagem corporal.

Apesar dos avanços, o prometido comprimido do amor continua a fazer parte da ficção. Até ao momento, as experiências têm insistido na ocitocina (usada já em medicamentos para induzir o parto). Os únicos produtos disponíveis não parecem muito credíveis. Um dos mais famosos é o spray da confiança da Verolabs, que segundo a bula faz maravilhas por solteiros mas também por vendedores e gestores de equipas.

Facto é que a área não tem parado de produzir conselhos. Helen Fisher, no último livro publicado em 2010 ("Why him? Why her?"), garante ter chegado a um teste para aferir a compatibilidade química. Basta ir a www.chemistry.com/ whyhim whyher/ e responder a questões como o desenho da sua mão, tipo de amizades ou quão frequentes são as discussões conjugais para perceber que tipo de pessoa é e quem procura. Mas já agora, goze primeiro o Dia dos Namorados.
 
Marta F. Reis, aqui