terça-feira, 25 de janeiro de 2011

ERA UMA VEZ...

A PASTA DE CABEDAL

Iam dois vagabundos por uma estrada, quando encontraram, do lado de fora de um portão de quinta rica, uma pasta de cabedal, daquelas que se está mesmo a ver que pertencem ou a banqueiros ou a financeiros ou a gente assim, com muito cabedal.

Os dois vagabundos olharam para a pasta, olharam um para o outro e, enquanto o diabo esfrega um olho, raparam da pasta e rasparam-se, antes que aparecessem outros atrás, que fizessem o mesmo.

Numa curva mais adiante, cansados da corrida, abrandaram de velocidade e abriram um dos fechos da pasta. O que viram deixou-os de olhos deslumbrados e redondos que nem os do goraz.

A pasta estava cheia de notas.

Até parecia que a descoberta lhes trouxera novas forças, porque voltaram a correr desalmadamente, esquecidos do cansaço, da fraqueza, de tudo.

Mas tanta correria acaba por esfalfar o coração e as pernas até dos mais premiados corredores olímpicos. Quando pararam, ensopados de suor, o que levava a pasta debaixo do braço, depois de engolir várias vezes em seco, disse:

- Com este tesouro que achei vou saber como é ser rico.

O outro protestou:

- Mas fomos nós dois que achámos. O recheio da pasta pertence a ambos.

- Isso querias tu - disse o primeiro vagabundo, apertando ainda mais a pasta de encontro ao corpo. - A pasta é minha.

- É nossa...

- É minha...

- É nossa...

Nisto ouviram uma voz gritar-lhes:

- Eh, pessoal! Para onde levam vocês essa pasta do senhor doutor?

Era um latagão, fardado de motorista. Não se lhe via o carro, mas, em tamanho e cilindrada, havia de condizer com ele. O homenzarrão tinha aparecido de surpresa, vindo de uma cancela do mesmo lado do portão da tal quinta.

O vagabundo que segurava a pasta ficou em pânico:

- Agora é que estamos tramados. Lá se vai a nossa pasta.

- Ai agora já é nossa? - riu-se o outro. - Presta tu contas dela, que eu não tenho nada a ver com isso.

E desamparou-o às mãos do motorista.

De pouco lhe valeu, porque o gigante justiceiro tratou da saúde ao que chamara a pasta a si e ainda lhe sobrou tempo para dar outra sova ao que se desligara da questão.

Depois afastou-se gloriosamente, com a pasta recuperada debaixo do braço, enquanto os dois vagabundos saboreavam o pó da estrada.

- Que grande coça que nós levámos - dizia um deles, não interessa qual.

O outro, qualquer que ele fosse, concordou...

António Torrado e Cristina Malaquias, aqui