Na data deste artigo, a dívida pública nacional atinge um valor superior a 130 mil milhões de euros. Em números, é algo como 130.000.000.000 euros. É um valor assustador.
Os mercados internacionais continuam a demarcar-se do Estado português e da sua dívida. Vale a pena analisar alguns dados. Portugal é neste momento o sétimo país do mundo mais arriscado. Pertencemos actualmente a um top 10 de risco que reúne nomes ilustres como Venezuela, Dubai, Grécia e Iraque. Portugal é considerado actualmente como duplamente mais arriscado que Rússia, Israel ou Colômbia.
Face a este panorama, o Governo nacional demorou mais de seis meses a reagir.
Alega o nosso primeiro-ministro que não estava claro para ele que fosse necessário tomar qualquer medida, pois eventualmente, a situação internacional melhoraria, e seriam então desnecessárias quaisquer medidas reformadoras do nosso sistema fiscal moribundo. Em finanças, este tipo de atitude tem apenas um nome - especulação. Só que, infelizmente, neste caso, a especulação foi efectuada com o dinheiro dos cidadãos e empresas. As implicações reais culminam na quase impossibilidade de qualquer empresa portuguesa obter financiamento internacional.
Entre 2011 e 2013, Portugal terá de emitir cerca de 60.000 milhões de euros de dívida pública (75% visam substituir dívida que entretanto chegará à sua maturidade, e os restantes 15.000 milhões visam pagar os défices públicos que irão existir entre 2011 e 2013). Só em 2011 Portugal terá de emitir cerca de 40.000 milhões de euros de dívida pública, dado que tem sucessivamente insistido em emissões de curto prazo, que chegarão à sua maturidade em 2011, e terão de ser renovadas. A estes valores somam-se mais de 15.000 milhões de euros de emissões de dívida a ser emitida pelos principais bancos nacionais. Contudo, estes que dependem a quase 100% da credibilidade da República. Se a nossa situação se deteriorar, os mercados internacionais podem ficar completamente fechados para alguns destes bancos, o que terá consequências muito nefastas na economia real.
Portugal paga hoje mais 4% de juro anual do que a Alemanha. Em 2007 este spread era de apenas 0,4%. Como qualquer família com crédito bancário compreende, um aumento de mais de 3% no juro a pagar tem um forte impacto no orçamento familiar. No caso de Portugal, relativamente a 2007 e a manterem-se os valores actuais de risco do país, iremos pagar anualmente mais 4000 a 6000 milhões de euros em juros adicionais. Em termos reais, isto significa que o custo do descalabro orçamental em que nos encontramos, é superior ao custo de um novo aeroporto de Lisboa por ano.
Neste contexto, o que foi feito entretanto? Uma redução das despesas onde é mais fácil (salários de funcionários públicos), e um aumento do imposto mais penalizador da classe média - o IVA. Ao mesmo tempo, em 2009 Portugal foi um dos países do mundo que mais contratou parcerias público-privadas (PPP). Como exemplo, em 2009, Portugal registou um volume de PPP três vezes superior ao da França. Infelizmente, o investimento público directo foi praticamente cancelado, e as PPP passaram a ser a regra em vez da excepção. Contudo, estas PPP têm encargos para os contribuintes muito superiores, e fazem também parte da dívida pública indirecta. Em finanças, chama-se a isto engenharia financeira. Ao entrarem sucessivamente em PPP do tipo empréstimo subprime, os sucessivos governos massajam as estatísticas, enganam a Comissão Europeia, mas acima de tudo, penhoram o futuro do país, e qualquer réstia de esperança em melhorar a nossa competitividade e nível de vida. Nos mercados internacionais, este comportamento vem agravar ainda mais o problema da dívida pública. A passagem do fundo de pensões da PT para o Estado tem também custos futuros elevadíssimos para o Estado. Quando a gestão da PT aplaude e os seus sindicatos se congratulam, parece claro que todos ficam a ganhar à excepção do contribuinte. Uma vez mais, a busca do lucro especulativo de curto prazo (redução do défice com medidas artificiais), sobrepõe-se como habitual à busca de uma solução criadora de valor de longo prazo.
Estamos num caminho insustentável. Estamos há 10 anos a divergir da UE. Fomos ultrapassados por 9 dos últimos 10 países que aderiram depois de nós. Quanto tempo mais vamos ter de divergir para que os nossos governantes deixem de seguir a solução fácil, engenharia financeira e transferência de riqueza para determinados grupos da nossa sociedade? Estimativas internacionais apontam apenas para 2037 a entrada no grupo dos países com dívida pública inferior a 60%. Efectuando algumas simulações em cenários bem mais optimistas (assumindo que as medidas apresentadas pelo Governo têm sucesso; a partir de 2013-2014 se atinja um balanço equilibrado; crescimento económico volte a atingir os 3% dentro de 4 anos) só em 2021 Portugal entrará novamente na lista de países com menos de 60% de dívida pública. Estes cenários revelam custos elevadíssimos, se o novo regime de procedimentos automáticos contra países incumpridores e reincidentes em matéria de indisciplina orçamental for aprovado pela União Europeia.
Em conclusão, parece evidente que as medidas de curto prazo apresentadas recentemente não são uma solução duradoira para os graves problemas da nação. Portugal tem de agir, e comunicar ao mercado que irá a partir daqui ter uma gestão financeira rigorosa. É tempo de parar com engenharias financeiras destruidoras de valor. Por que não utilizar algumas das boas práticas das nossas melhores empresas para a gestão do património público? Foi desastrosa a gestão da imagem pública da República nos mercados internacionais este ano. No entanto, temos várias das nossas empresas reconhecidas como excelentes em termos internacionais, e a receberem prémios de excelência em investor relations. Também a Espanha teve um comportamento exemplar este ano, com um roadshow muito bem sucedido, e elaborado com um elevado nível de profissionalismo. Em Portugal o que foi feito?
Nuno Fernandes, aqui