sexta-feira, 5 de novembro de 2010

FACE OCULTA: UM BACALHAU, TOMA LÁ 20 EUROS E BICO CALADO

As suspeitas de um funcionário da Prosegur resultaram numa proibição para Godinho. Os Penedo foram ajudar.

"No momento em que Pedro C. se aproximou dele, Manuel Godinho estendeu-lhe a mão e, durante o cumprimento, pôs-lhe uma nota de 20 euros na mão, por forma a que se abstivesse dos comportamentos delatores que tinha assumido em 2006 e assim não reportasse a entrada de camiões com carga." Não correu bem. O trabalhador da firma Prosegur, colocado na subestação de Alto Mira da REN - Rede Eléctrica Nacional -, entregou a nota aos chefes e enviou um relatório para as duas empresas. Corria o ano de 2008.
 
O relato consta da acusação do processo Face Oculta e diz respeito aos negócios entre a empresa de sucatas do empresário de Ovar, O2, e a REN.

O assunto já vinha de trás. Atento, Pedro C. começou, por sua iniciativa, a registar horas de entrada e saída de camiões e respectivos condutores. Percebeu, por exemplo, que as cargas dos camiões eram inferiores aos talões de pesagem emitidos pela O2. Mais: entre a hora de saída dos camiões na REN e a hora dos talões de pesagem na O2 havia espaço temporal que não permitia percorrer a distância entre as duas empresas. Pedro C. informou os chefes do que se estava a passar. Estes, por sua vez, informaram os arguidos - o director-geral da REN SGPS, Victor Baptista, o administrador da REN Trading, Fernando Santos, e Juan Oliveira, da divisão comercial.

GNR Já sabendo do sucedido, Namércio Cunha, considerado o braço-direito de Manuel Godinho, enviou um email para a divisão comercial a informar que "devido a encontrarem-se balanças da Brigada de Trânsito da GNR junto à REN, foram dadas indicação para reduzir o peso da carga". Segundo a acusação, Fernando Santos informou também o arguido José Penedos, mas ocultou as informações dos restantes administradores.

A partir dessa altura as pesagens dos camiões passaram a ser feitas na EDP e as cargas médias desceram de 31 para 24 toneladas.

Como a REN tivesse recusado aceitar os valores propostos pela O2, Manuel Godinho encontrou-se com Paulo Penedos, que assumiu, segundo o documento do Tribunal de Aveiro, a "resolução do conflito". Depois de vários contactos, emails, reuniões e conversas, duas empresas avaliaram a real quantidade de resíduos. A Quadrante chegou à conclusão de que foram demolidas cerca de 2 mil toneladas de betão, enquanto a Consulgal, contratada pela O2, apresentou um resultado de 7400 toneladas.

Paulo Penedos, depois de falar com o pai, propôs a Manuel Godinho que fizesse um desconto de 20%. O Ministério Público (MP) diz que a REN sofreu nestes negócios pelo menos um prejuízo de 506 mil euros.

Godinho e a REN Mas nem por isso a O2 deixou de prestar serviços à REN. Pelo contrário, continuou a prestar serviços nos anos seguintes. Dois anos mais tarde, em 2008, Manuel Godinho deslocou--se à estação da REN em Alto Mira e percebeu que o vigilante, Pedro C., era o mesmo que em 2006 tinha feito as denúncias, razão pela qual o terá cumprimentado com uma nota de 20 euros dobrada na mão. Foi quando Pedro C. deu conhecimento do caso a responsáveis da estação REN e ainda à sua própria empresa de segurança.

Segundo a acusação, houve várias reuniões e contactos sobre o sucedido, mas Albino M. e Costa M., ambos da REN, resolveram não dar conhecimento superior e enviar uma carta a Manuel Godinho repudiando a sua conduta e impedindo-o de entrar nas instalações da REN.

Já em 2009, Manuel Godinho deu conta a Paulo Penedos de que não tinha sido convidado para a cerimónia de apresentação do plano de investimentos da REN. O MP refere que Paulo pediu ao pai, José Penedos, um convite e o empresário de Ovar acabou por estar presente no evento.
 
Augusto Freitas de Sousa e Pedro Sales Dias, aqui